EUA na senda do desespero
Pela mão de George W. Bush, o imperialismo americano entrou numa das suas fases históricas mais perigosas desde a 2.ª Guerra Mundial. A sua proposta aos novos líderes democratas do Congresso, segundo a qual está preparado para observar uma política de entendimento com eles em questões de política interna, deixa explícita a intenção de reservar para si e para os seus acompanhantes na negra viagem a que meteu ombros a política externa, a guerra no Iraque, a escravização do mundo árabe e islâmico, o domínio do planeta, entre outras graves questões. Proposta difundida pela rádio no último sábado, causa preocupações ao mundo porque certas medidas para, desesperadamente, tentar ganhar a guerra, já estão a ser postas em prática com carácter de urgência.
O actual ocupante da Casa Branca sabe que os referidos líderes democratas saíram das recentes eleições fortalecidos pelos insistentes apelos do povo americano para que seja posto fim à guerra no Iraque, cujas consequências desastrosas estão a ser sentidas, profundamente, em todos os sectores da vida do país. No entanto, não acredita em que aqueles aceitem o jogo da confrontação que, agora, vai começar e, dadas as condições políticas criadas, também não deseja o papel de presidente em regime de part-time até às próximas eleições. Homem vingativo e cruel, completamente despido de considerações humanitárias, cínico, mentiroso, reservado, acha-se envolvido numa situação gravíssima da qual pretende fugir procurando uma impossível vitória militar no Iraque. Na verdade, não faltam no Senado e na Câmara dos Representantes candidatos à elaboração de propostas que impeçam o presidente de continuar em funções. A América não está de olhos fechados a três circunstâncias: o facto de que Bush carrega aos ombros a sombra de 3006 soldados mortos no Iraque, além de 25 000 feridos, muitos dos quais espalhados pelos hospitais de serviços clínicos e psicológicos; não esquece que a intervenção contra Saddam Hussein foi feita, falsamente, segundo pretextos que nunca se confirmaram; e também não esquece o custo desta guerra que tem empobrecido o país, que tem lançado milhões de pessoas na miséria e fez calar a boca aos propagandistas de umamerican way of life imaginário, falso, irrealizável quando o capitalismo se afunda no atoleiro da guerra, das mortes, dos protestos, da revolta. O que vai fazer George W. Bush?
Na senda da confrontação
Já estão a ser postas em prática diversas mudanças de pessoal. Por exemplo, o embaixador americano em Bagdad, Zalmay Kalilzad, um afegão sinistro em quem o «governo» iraquiano não tem confiança e não se percebe como pode ser embaixador dos Estados Unidos, passa para as Nações Unidas. O general George Casey, comandante das forças americanas em operações no Iraque, vai ser substituído pelo general David Petraeus, que já esteve no país em comissão de serviço anterior e que lá deixou um rasto de mistério e de brutalidade. Também o general John Abizaid, comandante americano em todo o teatro de operações no Médio Oriente, cederá o seu lugar ao almirante William Fallon, um especialista em serviços de espionagem. Como se sabe, Abizaid e Casey eram favoráveis a uma retirada gradual. Bush, entretanto, decidiu voltar as costas a essa iniciativa e prepara-se para anunciar a mobilização de mais 30 000 homens que farão elevar para 180 000 soldados o efectivo ao dispor do comando americano no Iraque. Também John Negroponte, director de serviços de espionagem e contra-espionagem, vai ser transferido para uma posição secundária, a de ajudante de Condolezza Rice, a secretária de Estado conhecida como a mais diplomada nas «ciências» do anticomunismo e do anti-sovietismo em que se especializou. Negroponte vai ser substituído pelo almirante Mike McConnell, antigo director da Agência Nacional de Segurança (National Security Agency), uma organização especializada na captura de informações por meios tecnológicos e não por meios humanos.
Estamos a ver, portanto, que o presidente Bush vai avançar sem imaginação, sem iniciativas de real peso, sem inteligência, sem capacidade para diversificar, sem uma nova política. Vai avançar, sim, para dar ao mundo as mesmíssimas receitas que já se conhecem e cujos resultados estão bem à vista – as da insegurança, da guerra sem fronteiras, do terrorismo, do sofrimento, do ódio, do descalabro, da bancarrota, da ameaça, da chantagem, da morte, da alucinação. Para onde vai a América? Os novos líderes democratas do Congresso, Nancy Pelosi (Câmara dos Representantes) e Harry Reid (Senado) escreveram ao presidente avisando-o de que «o envio de mais tropas de combate colocará em perigo mais vidas americanas e fará aproximar do seu limite a estrutura militar do país sem qualquer ganho estratégico». Escreveram em termos polidos e esclarecidos, não desejando avançar na estrada da confrontação. Mas esta, cedo ou tarde, vai verificar-se.
Caldwell lava as mãos
do assassínio de Saddam
Foi doloroso ouvir o major-general William Caldwell declarar, numa conferência de imprensa realizada em Bagdad após o assassínio de Saddam Hussein, que os americanos nada tinham a ver com a execução do antigo ditador iraquiano. Eis as suas palavras: «Não tivemos absolutamente nada a ver com a forma como a execução teve lugar. É o sistema deles, dos iraquianos. Se fossemos nós a estar, fisicamente, no controlo da execução, as coisas teriam sido feitas de maneira diferente». Estas grosseiras palavras feriram a consciência de uma boa parte dos observadores internacionais. Quem, no fim de contas, realizou a invasão do Iraque e abriu as postas ao inacreditável morticínio que está a ocorrer? Quem prendeu Saddam Hussein? Quem lhe preparou o julgamento através de juizes pagos para a realização desse espectáculo degradante a que o mundo assistiu pretendendo-se dar a impressão de que o julgamento era imparcial e se realizava num tribunal do «novo» Iraque «democrático» em nome de uma «justiça» nova? Quem esteve na posse física do preso até ao dia da execução? Quem o entregou aos carrascos algumas horas antes da execução? Os americanos, históricos especialistas em execuções, nunca estiveram interessados, realmente, em que Saddam Hussein fosse julgado em condições aceitáveis ou executado com dignidade. É assim que estão habituados. Mas nunca lhes passou pela cabeça que o mundo reparasse e se horrorizasse perante aquele crime. No fim de contas, foi só mais um.
Petraeus, o militar que se segue
David Petraeus ficou conhecido como o pacificador de Mossul, a antiga capital da Alta Mesopotâmia, hoje importante centro de produção petrolífera, e como autor de «bilhetinhos» que os soldados americanos deixavam nas casas dos iraquianos onde entravam à força e de quem suspeitavam. Esses bilhetes diziam simplesmente: «Muito obrigado por nos terem deixado revistar a vossa casa». Prática mais cínica e mais próxima daquelas que usavam os SS em Auschwitz-Birkenau não se conhece.
Diz-se que o general Petraeus é um comunicador, talvez um futuro presidente. Já leva 35 anos de carreira militar e possui uma notável robustez física, a par de considerável capacidade militar e intelectual. Nos meios militares americanos no Iraque não falta quem assevere que é ele, David Petraeus, quem levará os americanos à vitória no Iraque. Ou ele ou ninguém mais. Foi comandante da célebre 101.ª divisão de tropas aerotransportadas, logo no início da invasão do Iraque, tendo-se mostrado capaz de fundar relações com chefes tribais locais. Filho de um capitão da marinha mercante holandesa, diplomou-se na Academia Militar de West Point, em 1974. De então para cá a sua carreira nunca deixou de se processar de maneira ascensional.
Quem quer trabalhar na América
(euros: 5,50/hora)?
O novo Congresso abriu para a sua 110.ª sessão, em Washington, sob o signo da guerra no Iraque. Mas, entre as medidas que começaram a ser discutidas nas primeiras 100 horas de debates destacou-se o aumento do salário mínimo que se pretende passe de $5.15 por hora para $7.25 (Euros: 5,50), uma soma irrisória no país das grandes fortunas, que no entanto pode significar alguma coisa para milhões de desfavorecidos e pobres nesse mesmo país das grandes misérias e das grandes carências. O que está a passar-se na América?
Outras importantes questões que o novo Congresso vai discutir, são: 1- a dos subsídios estatais às grandes companhias que dominam as indústrias ligadas ao petróleo, e a proposta para que seja criada uma reserva nacional de combustíveis enquanto se estimula a investigação no campo das energias alternativas; 2 - a de uma eventual acusação ao presidente Bush que um considerável número de congressistas quer ver suspenso e, eventualmente, julgado; poucos admitem que, se tal acontecer, o presidente venha a ser perdoado por quem lhe suceder, como aconteceu a Richard Milhous Nixon, que recebeu de Gerald Ford, recentemente falecido, um perdão inesperado e injustificado; 3 - elaboração e passagem de uma lei que limite a atribuição de fundos para a guerra; 4 - ouvir os responsáveis pela acumulação de lucros imorais nos sectores da saúde, da energia, dos negócios resultantes da guerra no Iraque e da inaceitável resposta à catástrofe resultante do furacão Katrina.
Tragédia americana
A crise está a transformar a vida. Naturalmente, trata-se da crise fatal do capitalismo para a qual os comunistas, e só eles, têm a resposta adequada. Mas nem sempre é fácil apontar o capitalismo a americanos que viveram toda a vida manipulados pela propaganda do american way of life e dominados por um medo profundo relativamente aos comunistas. Entretanto, se lhes falarmos da crise social e da terrível situação criada pela guerra do Iraque, então, os americanos compreendem melhor. Por isso, muitos se abriram perante este correspondente do Avante! numa recente festa de família. Assim, quase com as lágrimas nos olhos, uma bibliotecária de escola secundária em determinada localidade do Estado de Illinois, disse: «Não temos dinheiro para livros, para material de não importa que espécie, para lápis ou canetas. Se as carteiras se estragam, os alunos têm de se sentar no chão. Nunca se tinha visto tais carências nos Estados Unidos». Um trabalhador da construção civil em Atlanta, Geórgia, manifestava reservas mas, animado com o curso de um jantar português, num restaurante da Parede, desabafou: «Temos de acabar com a tendência para sermos os polícias do mundo. As guerras só nos arruinam. Estive no Vietname e julguei que aquela seria última guerra em que a América se envolveria». À nossa pergunta sobre o que fizera no Vietname, esclareceu: «Estive na base de Bien-Hoa de onde patrulhávamos largas áreas para descobrir de onde vinha o Vietcong. A princípio, ainda contava os que morriam, mas desisti porque as nossas baixas não tinham fim». O endividamento das famílias e de milhões de cidadãos individuais é outra matéria de que falaram, extremamente comovidos, os nossos convidados vindos dos Estados Unidos. E as consequências do Katrina? E a dor de milhares de famílias cujos filhos tombam mortos ou feridos no Iraque?
Oportuna leitura de Fim de Ano
O aparecimento no mercado londrino do livro «Vietname: História definitiva», de Christian G. Appy; (em>Editora: Ebury, 608 páginas, preço Euros: 29,60), surgiu no melhor momento para que se compreenda melhor o que se está a passar no Iraque. Com efeito, quanto mais avançamos na leitura da obra, mais criminosa nos parece a guerra que começou como clandestina, em 1956, e duraria até 1975. No fim, os Estados Unidos contavam 58 000 mortos contra um milhão de vietnamitas. O custo foi computado em 200 mil milhões de dólares. Este livro e, no geral, a aventura louca dos americanos no país de Ho Chi Minh, enquadra-se bem naquilo que está a acontecer no Iraque, onde o número de mortos americanos é, ainda, de 3006 mas os custos já sobem a três triliões de dólares. Cerca de 70% dos 173 generais americanos que serviram no Sueste asiático diriam, no fim, que nunca tinham compreendido os motivos do conflito. Nunca, na verdade, surgiram respostas claras quanto ao porquê dessa guerra ou, quanto ao mal que se fez aos povos do Cambodja, do Laos, do Vietname. Naturalmente, os comunistas sabem o que os imperialistas pretendem quando se lançam numa guerra. Mas os governos americanos nunca disseram, claramente, o que os levou a mobilizar uma força permanente de mais de 500 000 homens para combater um país que saía da condição de colonizado, queria ser livre e não punha em perigo os interesses dos Estados Unidos. Disse o general TraynoTraynor: «Estávamos a destruir o Vietname do Norte. Mas não víamos que nos destruíamos a nós próprios e levávamos a morte a milhões de pessoas inocentes».
Quando do massacre de My Lai, a imoralidade que consistia em enviar a juventude americana para assassinar um inimigo que nem se distinguia da própria população, tornou-se evidente. E o papel de figuras como as de Robert McNamara e Henry Kissinger tornou-se, pelo menos, repugnante. O drama do Vietname terminou há 31 anos. Estamos a ver os criminosos bombardeamentos aéreos sobre Hanoi e Haiphong, a luta por Danang e Hué, a entrada do Vietcong em Saigão. Parece que os americanos esqueceram as lições recebidas e é por isso que estão a repetir a história dos seus incomensuráveis fracassos no Iraque. Mas se a sociedade civil nos Estados Unidos aceitou sem rancor a clamorosa derrota sofrida no Vietname, não estamos a ver que aceite a derrota que se anuncia no Iraque sem pedir contas aos seus responsáveis. Já temos aí a crise da indústria transformadora, a crise orçamental, a crise da administração pública, a crise moral, a crise financeira, a profunda crise de perspectivas. Mas, no fundo não existe senão uma única crise, a do capitalismo.
Na senda da confrontação
Já estão a ser postas em prática diversas mudanças de pessoal. Por exemplo, o embaixador americano em Bagdad, Zalmay Kalilzad, um afegão sinistro em quem o «governo» iraquiano não tem confiança e não se percebe como pode ser embaixador dos Estados Unidos, passa para as Nações Unidas. O general George Casey, comandante das forças americanas em operações no Iraque, vai ser substituído pelo general David Petraeus, que já esteve no país em comissão de serviço anterior e que lá deixou um rasto de mistério e de brutalidade. Também o general John Abizaid, comandante americano em todo o teatro de operações no Médio Oriente, cederá o seu lugar ao almirante William Fallon, um especialista em serviços de espionagem. Como se sabe, Abizaid e Casey eram favoráveis a uma retirada gradual. Bush, entretanto, decidiu voltar as costas a essa iniciativa e prepara-se para anunciar a mobilização de mais 30 000 homens que farão elevar para 180 000 soldados o efectivo ao dispor do comando americano no Iraque. Também John Negroponte, director de serviços de espionagem e contra-espionagem, vai ser transferido para uma posição secundária, a de ajudante de Condolezza Rice, a secretária de Estado conhecida como a mais diplomada nas «ciências» do anticomunismo e do anti-sovietismo em que se especializou. Negroponte vai ser substituído pelo almirante Mike McConnell, antigo director da Agência Nacional de Segurança (National Security Agency), uma organização especializada na captura de informações por meios tecnológicos e não por meios humanos.
Estamos a ver, portanto, que o presidente Bush vai avançar sem imaginação, sem iniciativas de real peso, sem inteligência, sem capacidade para diversificar, sem uma nova política. Vai avançar, sim, para dar ao mundo as mesmíssimas receitas que já se conhecem e cujos resultados estão bem à vista – as da insegurança, da guerra sem fronteiras, do terrorismo, do sofrimento, do ódio, do descalabro, da bancarrota, da ameaça, da chantagem, da morte, da alucinação. Para onde vai a América? Os novos líderes democratas do Congresso, Nancy Pelosi (Câmara dos Representantes) e Harry Reid (Senado) escreveram ao presidente avisando-o de que «o envio de mais tropas de combate colocará em perigo mais vidas americanas e fará aproximar do seu limite a estrutura militar do país sem qualquer ganho estratégico». Escreveram em termos polidos e esclarecidos, não desejando avançar na estrada da confrontação. Mas esta, cedo ou tarde, vai verificar-se.
Caldwell lava as mãos
do assassínio de Saddam
Foi doloroso ouvir o major-general William Caldwell declarar, numa conferência de imprensa realizada em Bagdad após o assassínio de Saddam Hussein, que os americanos nada tinham a ver com a execução do antigo ditador iraquiano. Eis as suas palavras: «Não tivemos absolutamente nada a ver com a forma como a execução teve lugar. É o sistema deles, dos iraquianos. Se fossemos nós a estar, fisicamente, no controlo da execução, as coisas teriam sido feitas de maneira diferente». Estas grosseiras palavras feriram a consciência de uma boa parte dos observadores internacionais. Quem, no fim de contas, realizou a invasão do Iraque e abriu as postas ao inacreditável morticínio que está a ocorrer? Quem prendeu Saddam Hussein? Quem lhe preparou o julgamento através de juizes pagos para a realização desse espectáculo degradante a que o mundo assistiu pretendendo-se dar a impressão de que o julgamento era imparcial e se realizava num tribunal do «novo» Iraque «democrático» em nome de uma «justiça» nova? Quem esteve na posse física do preso até ao dia da execução? Quem o entregou aos carrascos algumas horas antes da execução? Os americanos, históricos especialistas em execuções, nunca estiveram interessados, realmente, em que Saddam Hussein fosse julgado em condições aceitáveis ou executado com dignidade. É assim que estão habituados. Mas nunca lhes passou pela cabeça que o mundo reparasse e se horrorizasse perante aquele crime. No fim de contas, foi só mais um.
Petraeus, o militar que se segue
David Petraeus ficou conhecido como o pacificador de Mossul, a antiga capital da Alta Mesopotâmia, hoje importante centro de produção petrolífera, e como autor de «bilhetinhos» que os soldados americanos deixavam nas casas dos iraquianos onde entravam à força e de quem suspeitavam. Esses bilhetes diziam simplesmente: «Muito obrigado por nos terem deixado revistar a vossa casa». Prática mais cínica e mais próxima daquelas que usavam os SS em Auschwitz-Birkenau não se conhece.
Diz-se que o general Petraeus é um comunicador, talvez um futuro presidente. Já leva 35 anos de carreira militar e possui uma notável robustez física, a par de considerável capacidade militar e intelectual. Nos meios militares americanos no Iraque não falta quem assevere que é ele, David Petraeus, quem levará os americanos à vitória no Iraque. Ou ele ou ninguém mais. Foi comandante da célebre 101.ª divisão de tropas aerotransportadas, logo no início da invasão do Iraque, tendo-se mostrado capaz de fundar relações com chefes tribais locais. Filho de um capitão da marinha mercante holandesa, diplomou-se na Academia Militar de West Point, em 1974. De então para cá a sua carreira nunca deixou de se processar de maneira ascensional.
Quem quer trabalhar na América
(euros: 5,50/hora)?
O novo Congresso abriu para a sua 110.ª sessão, em Washington, sob o signo da guerra no Iraque. Mas, entre as medidas que começaram a ser discutidas nas primeiras 100 horas de debates destacou-se o aumento do salário mínimo que se pretende passe de $5.15 por hora para $7.25 (Euros: 5,50), uma soma irrisória no país das grandes fortunas, que no entanto pode significar alguma coisa para milhões de desfavorecidos e pobres nesse mesmo país das grandes misérias e das grandes carências. O que está a passar-se na América?
Outras importantes questões que o novo Congresso vai discutir, são: 1- a dos subsídios estatais às grandes companhias que dominam as indústrias ligadas ao petróleo, e a proposta para que seja criada uma reserva nacional de combustíveis enquanto se estimula a investigação no campo das energias alternativas; 2 - a de uma eventual acusação ao presidente Bush que um considerável número de congressistas quer ver suspenso e, eventualmente, julgado; poucos admitem que, se tal acontecer, o presidente venha a ser perdoado por quem lhe suceder, como aconteceu a Richard Milhous Nixon, que recebeu de Gerald Ford, recentemente falecido, um perdão inesperado e injustificado; 3 - elaboração e passagem de uma lei que limite a atribuição de fundos para a guerra; 4 - ouvir os responsáveis pela acumulação de lucros imorais nos sectores da saúde, da energia, dos negócios resultantes da guerra no Iraque e da inaceitável resposta à catástrofe resultante do furacão Katrina.
Tragédia americana
A crise está a transformar a vida. Naturalmente, trata-se da crise fatal do capitalismo para a qual os comunistas, e só eles, têm a resposta adequada. Mas nem sempre é fácil apontar o capitalismo a americanos que viveram toda a vida manipulados pela propaganda do american way of life e dominados por um medo profundo relativamente aos comunistas. Entretanto, se lhes falarmos da crise social e da terrível situação criada pela guerra do Iraque, então, os americanos compreendem melhor. Por isso, muitos se abriram perante este correspondente do Avante! numa recente festa de família. Assim, quase com as lágrimas nos olhos, uma bibliotecária de escola secundária em determinada localidade do Estado de Illinois, disse: «Não temos dinheiro para livros, para material de não importa que espécie, para lápis ou canetas. Se as carteiras se estragam, os alunos têm de se sentar no chão. Nunca se tinha visto tais carências nos Estados Unidos». Um trabalhador da construção civil em Atlanta, Geórgia, manifestava reservas mas, animado com o curso de um jantar português, num restaurante da Parede, desabafou: «Temos de acabar com a tendência para sermos os polícias do mundo. As guerras só nos arruinam. Estive no Vietname e julguei que aquela seria última guerra em que a América se envolveria». À nossa pergunta sobre o que fizera no Vietname, esclareceu: «Estive na base de Bien-Hoa de onde patrulhávamos largas áreas para descobrir de onde vinha o Vietcong. A princípio, ainda contava os que morriam, mas desisti porque as nossas baixas não tinham fim». O endividamento das famílias e de milhões de cidadãos individuais é outra matéria de que falaram, extremamente comovidos, os nossos convidados vindos dos Estados Unidos. E as consequências do Katrina? E a dor de milhares de famílias cujos filhos tombam mortos ou feridos no Iraque?
Oportuna leitura de Fim de Ano
O aparecimento no mercado londrino do livro «Vietname: História definitiva», de Christian G. Appy; (em>Editora: Ebury, 608 páginas, preço Euros: 29,60), surgiu no melhor momento para que se compreenda melhor o que se está a passar no Iraque. Com efeito, quanto mais avançamos na leitura da obra, mais criminosa nos parece a guerra que começou como clandestina, em 1956, e duraria até 1975. No fim, os Estados Unidos contavam 58 000 mortos contra um milhão de vietnamitas. O custo foi computado em 200 mil milhões de dólares. Este livro e, no geral, a aventura louca dos americanos no país de Ho Chi Minh, enquadra-se bem naquilo que está a acontecer no Iraque, onde o número de mortos americanos é, ainda, de 3006 mas os custos já sobem a três triliões de dólares. Cerca de 70% dos 173 generais americanos que serviram no Sueste asiático diriam, no fim, que nunca tinham compreendido os motivos do conflito. Nunca, na verdade, surgiram respostas claras quanto ao porquê dessa guerra ou, quanto ao mal que se fez aos povos do Cambodja, do Laos, do Vietname. Naturalmente, os comunistas sabem o que os imperialistas pretendem quando se lançam numa guerra. Mas os governos americanos nunca disseram, claramente, o que os levou a mobilizar uma força permanente de mais de 500 000 homens para combater um país que saía da condição de colonizado, queria ser livre e não punha em perigo os interesses dos Estados Unidos. Disse o general TraynoTraynor: «Estávamos a destruir o Vietname do Norte. Mas não víamos que nos destruíamos a nós próprios e levávamos a morte a milhões de pessoas inocentes».
Quando do massacre de My Lai, a imoralidade que consistia em enviar a juventude americana para assassinar um inimigo que nem se distinguia da própria população, tornou-se evidente. E o papel de figuras como as de Robert McNamara e Henry Kissinger tornou-se, pelo menos, repugnante. O drama do Vietname terminou há 31 anos. Estamos a ver os criminosos bombardeamentos aéreos sobre Hanoi e Haiphong, a luta por Danang e Hué, a entrada do Vietcong em Saigão. Parece que os americanos esqueceram as lições recebidas e é por isso que estão a repetir a história dos seus incomensuráveis fracassos no Iraque. Mas se a sociedade civil nos Estados Unidos aceitou sem rancor a clamorosa derrota sofrida no Vietname, não estamos a ver que aceite a derrota que se anuncia no Iraque sem pedir contas aos seus responsáveis. Já temos aí a crise da indústria transformadora, a crise orçamental, a crise da administração pública, a crise moral, a crise financeira, a profunda crise de perspectivas. Mas, no fundo não existe senão uma única crise, a do capitalismo.