- Nº 1728 (2007/01/11)
Projecto de resolução do PCP

Conhecer e valorizar a luta antifascista

Assembleia da República

A Assembleia da República condena, «como contrário à Constituição, o desenvolvimento de propaganda fascista, assim como tentativas de desculpabilização e branqueamento dos crimes da ditadura e reabilitação dos seus principais responsáveis». Esta é uma das decisões que consta do projecto de resolução entregue esta semana pelo Grupo Parlamentar do PCP na Assembleia da República sobre o regime fascista que oprimiu o nosso povo e as tentativas em curso de o branquear.
Intitulado Pelo conhecimento e valorização da luta anti-fascista em Portugal, o texto sublinha a vontade de a Assembleia da República «contribuir, no âmbito da sua actividade institucional, para a vivificação do conhecimento sobre a ditadura fascista e a resistência antifascista».
Após uma exposição inicial onde recorda o que foi e representou a resistência à ditadura fascista de Salazar e Caetano, o projecto de resolução recomenda ao Governo que, «no âmbito das suas funções executivas, tome as medidas necessárias para garantir e apoiar a existência e o desenvolvimento de espaços e instituições dedicados à manutenção e alargamento do conhecimento histórico da ditadura, especialmente aqueles que, tendo desempenhado um papel específico nesse período, adquiram por isso especial valor simbólico».
Recomendada pela Assembleia da República é igualmente uma «particular valorização e apoio ao Museu da Resistência instalado na Fortaleza de Peniche», do mesmo modo que é recomendado ao Governo que, «no mesmo sentido, e no desenvolvimento da política externa, promova formas de cooperação com os Estados surgidos das ex-colónias portuguesas para preservação do património de luta comum contra o fascismo e o colonialismo português, nomeadamente o campo de concentração do Tarrafal».
A Assembleia da República resolve ainda «apelar aos órgãos e instituições dedicados à divulgação cultural, histórica e informativa que, de forma rigorosa e objectiva, se empenhem na difusão pública do conhecimento desta época da história recente do nosso país», lê-se no texto proposto pela bancada comunista, que «pugna», simultaneamente, «para que o Governo e as demais entidades responsáveis garantam a efectiva abordagem do período da ditadura fascista, da resistência antifascista, bem como da Revolução de Abril, nos currículos escolares dos diversos níveis de ensino».

Luta heróica pela liberdade

Nos seus considerandos, reportando-se à resistência e luta do povo português, o projecto de resolução da autoria do PCP lembra que «ao longo dos 48 anos da ditadura em Portugal, quer sob a chefia de Salazar quer de Caetano, o povo português resistiu sempre, de muitas e variadas formas, à opressão fascista. A luta antifascista, pela liberdade, pela democracia, contra as medidas e acções repressivas e opressoras, por melhores condições de vida e trabalho, contra a guerra colonial e o colonialismo, envolveu amplas camadas da população: operários fabris, operários agrícolas, estudantes, militares, pescadores, intelectuais, artistas e tantos outros. Essa longa e heróica luta dos trabalhadores e das massas populares abriu caminho ao derrube da ditadura pelos militares do MFA e à conquista da liberdade, ao fim das guerras coloniais e a grandes transformações democráticas resultantes da Revolução de Abril e consagradas na Constituição de 1976».
Os autores do texto concluem depois, «mais de 30 anos passados sobre a Revolução e a consagração das suas conquistas na Lei Fundamental», que é «largamente insatisfatório o conhecimento e a valorização das características da ditadura fascista e do valor e heroicidade da luta das pessoas e organizações que se lhe opuseram».
Desde logo, segundo o PCP, «pelo apagamento ou branqueamento da conduta e das acções da ditadura, que menoriza ou esconde a ausência de liberdades políticas e cívicas, a polícia política, a censura, os tribunais plenários, a prática das mais bárbaras torturas, as condenações forjadas e as arbitrárias medidas de segurança, as prisões políticas como o Aljube, Caxias ou o Forte de Peniche, o campo de concentração do Tarrafal, o conluio com os regimes fascistas europeus, a repressão violenta das lutas operárias e populares e da oposição democrática, a perseguição da cultura e do pensamento progressista, a guerra colonial e ainda o atraso e a pobreza extrema do país».
«E mais grave se torna esta desvalorização numa situação internacional em que ressurgem actos e intenções de limitação das liberdades, de amputação da democracia, de ampliação das injustiças e desigualdades e até de retoma dos mais infames e criminosos métodos de perseguição, como o aprisionamento ilegal e arbitrário ou a tortura legalizada, ao mesmo tempo que ressurgem inquietantes fenómenos de racismo, fascismo e anticomunismo», acrescenta o projecto de resolução, apontando criticamente, por outro lado, a «deturpação e desconhecimento a que estão sujeitos os valorosos actos da resistência antifascista, pagos por vezes com a própria vida, com a sujeição a violentas e infames torturas, com a prisão, com a destruição da vida profissional ou académica, com o exílio, e tantas vezes praticados em difíceis condições de clandestinidade que impunham dolorosas restrições à vida pessoal e familiar».
Todas estas razões tornam indispensável, por isso, na perspectiva dos comunistas, «manter vivo o conhecimento do que foi a ditadura que durante 48 anos oprimiu os portugueses e reconhecer o inestimável valor dos que contra ela lutaram».
O que não tem acontecido, como refere o projecto de resolução, observando, a este propósito, que a «preservação e transmissão do conhecimento destas realidades é chocantemente insuficiente, seja no sistema educativo, seja nos meios de divulgação informativa e cultural, seja na preservação dos espaços que mais simbolicamente representaram a opressão, a resistência e a luta do povo».
Daí que, como é dito, «aos democratas e às instituições democráticas, impõe-se o dever de alterar esta inaceitável situação, na certeza de que a preservação do conhecimento do que foi a ditadura fascista e da luta dos que a combateram, é a melhor garantia para o enraizamento dos valores democráticos e de apego à liberdade entre as novas gerações».