A DEMOCRACIA DELES
«O empresário tem o primeiro-ministro que quer, o primeiro-ministro tem o empresário que o quer»
Cresce, assumindo um carácter cada vez mais alarmante e perigoso, a insolência e a arrogância com que os chefes dos grandes grupos económicos e financeiros se pronunciam sobre a situação política e sobre o regime democrático. Invocando um denominado projecto nacional - que outra coisa não é se não o projecto da classe que representam e que nada tem a ver com o interesse nacional, bem pelo contrário - eles têm como objectivo primeiro, na situação actual, destruir a Constituição da República Portuguesa e fazer aprovar, em sua substituição, uma constituição à medida exacta dos seus interesses. Um desses empresários, «com currículo e obra feita (comprovados pelo facto de ser o homem mais rico do País), propõe-se, mesmo, «promover um movimento de 20 a 30 empresários» visando «a mudança da Constituição» no sentido de o Estado poder «fazer coisas difíceis», como sejam «tomadas de decisões socialmente complexas». Para essa mudança há, segundo Belmiro de Azevedo, uma «conjugação favorável dos astros», que enuncia assim: «Temos um Parlamento, um Presidente da República e um Governo em sintonia sobre o que se deve fazer» - e há que reconhecer que não se poderia ser mais claro e incisivo na caracterização dos governantes nacionais… Mas o empresário «com currículo» não deixa nada ao acaso, de tal modo que, face a esta «situação aparentemente muito fácil», avisa «o chefe da oposição» de que «ficará muito mal na fotografia se, por razões nacionais, não der um contributo positivo» e que não terá «credibilidade» se não «apoiar o projecto nacional»
É claro que, quando fala em «chefe da oposição» Belmiro de Azevedo refere-se ao líder do PSD – fingindo acreditar, e pretendendo que acreditemos, na existência de uma oposição PSD/PS (ou PS/PSD, para o caso tanto faz e a ordem dos factores é arbitrária); e assobia para o ar face ao facto concreto de, ao longo dos últimos trinta anos, estes dois partidos terem estado em perfeita sintonia sobre o que se deve fazer, na base de uma prática que pode resumir-se assim: ora agora governas tu e eu finjo que sou oposição, ora agora governo eu e tu finges que és oposição – e sempre, sempre, um e outro governando para bem servir os currículos e a obra feita dos donos do País.
O ódio à Constituição de Abril é uma constante em todos os representantes do grande capital. Percebe-se que assim seja: trata-se do ódio de classe a uma Lei Fundamental do País que, pela primeira vez na história de Portugal, consagrou direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores e do povo; definiu a independência e a soberania nacionais como pilares essenciais da nossa identidade; instituiu uma democracia avançada na qual as vertentes política, económica, social e cultural, de conteúdo progressista e de aplicação complementar e simultânea, têm como referência primeira a defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do País. É esta Constituição – aliás, violada e desrespeitada por todos os governos PS e PSD ao longo de três décadas – que, hoje, está na mira da ofensiva do grande capital. Belmiro de Azevedo é claro na enunciação dos seus objectivos: é necessário, segundo ele, «tentar uma Constituição nova»; que acabe com a determinação de «que o poder económico deve estar controlado pelo poder político»; que defina «uma estrutura em que Portugal tenha apenas um primeiro-ministro, dez ministros e cem deputados» - ou seja, uma «Constituição nova» que coloque o poder político na dependência do poder económico e que crie o executivo capaz de, fiel, servil e eficazmente, servir plenamente os interesses do poder económico. E, interpretando a história à sua maneira, ajeitando-a à medida dos seus objectivos e adiantando desde já um argumento de peso, decide que «a Constituição obtida a seguir ao 25 de Abril foi sob coacção» - para, de imediato, partindo das mesmas premissas e recorrendo à ironia arrogante típica dos representantes do grande capital de todas as épocas, decretar: «Agora, não será sob coacção, é mais a ditadura de uma maioria democrática»
Quem procurar, neste processo de raciocínio e neste modelo de «constituição nova», semelhanças com o passado anterior ao 25 de Abril, encontrá-las-á sem grande esforço. E não se trata, obviamente, de pura coincidência.
No que respeita às medidas já aplicadas e às medidas anunciadas pelo Governo, Belmiro de Azevedo mostra-se satisfeito com a prestação de José Sócrates - tanto quanto os trabalhadores se mostram insatisfeitos, naturalmente – e cheio de confiança no futuro, assim dando razão aos que dizem ser este Governo PS/Sócrates o que, nos últimos trinta anos, melhor soube interpretar os interesses do grande capital – o que se sabia constituir tarefa difícil, se tivermos em conta as práticas de todos os governos que o antecederam. Na verdade, achando Belmiro de Azevedo que as medidas já aplicadas «são insuficientes» e que «decisões para mudar o País não houve nenhuma» (mas, isto é ele a falar…), acha, também, e isso é o mais importante, que todo este não fazer de Sócrates é feito «de uma forma premeditada», isto é, «o primeiro-ministro está a fazer isto intencionalmente, numa espécie de sondagem» - assim como quem ajeita o pescoço da vítima para a machadada final. Tudo bem, então: o empresário tem o primeiro-ministro que quer, o primeiro-ministro tem o empresário que o quer. E têm, ambos, a oposição que desejam. E têm, todos, como objectivo único bem servir os interesses do empresário. Eis a democracia deles.
É claro que, quando fala em «chefe da oposição» Belmiro de Azevedo refere-se ao líder do PSD – fingindo acreditar, e pretendendo que acreditemos, na existência de uma oposição PSD/PS (ou PS/PSD, para o caso tanto faz e a ordem dos factores é arbitrária); e assobia para o ar face ao facto concreto de, ao longo dos últimos trinta anos, estes dois partidos terem estado em perfeita sintonia sobre o que se deve fazer, na base de uma prática que pode resumir-se assim: ora agora governas tu e eu finjo que sou oposição, ora agora governo eu e tu finges que és oposição – e sempre, sempre, um e outro governando para bem servir os currículos e a obra feita dos donos do País.
O ódio à Constituição de Abril é uma constante em todos os representantes do grande capital. Percebe-se que assim seja: trata-se do ódio de classe a uma Lei Fundamental do País que, pela primeira vez na história de Portugal, consagrou direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores e do povo; definiu a independência e a soberania nacionais como pilares essenciais da nossa identidade; instituiu uma democracia avançada na qual as vertentes política, económica, social e cultural, de conteúdo progressista e de aplicação complementar e simultânea, têm como referência primeira a defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do País. É esta Constituição – aliás, violada e desrespeitada por todos os governos PS e PSD ao longo de três décadas – que, hoje, está na mira da ofensiva do grande capital. Belmiro de Azevedo é claro na enunciação dos seus objectivos: é necessário, segundo ele, «tentar uma Constituição nova»; que acabe com a determinação de «que o poder económico deve estar controlado pelo poder político»; que defina «uma estrutura em que Portugal tenha apenas um primeiro-ministro, dez ministros e cem deputados» - ou seja, uma «Constituição nova» que coloque o poder político na dependência do poder económico e que crie o executivo capaz de, fiel, servil e eficazmente, servir plenamente os interesses do poder económico. E, interpretando a história à sua maneira, ajeitando-a à medida dos seus objectivos e adiantando desde já um argumento de peso, decide que «a Constituição obtida a seguir ao 25 de Abril foi sob coacção» - para, de imediato, partindo das mesmas premissas e recorrendo à ironia arrogante típica dos representantes do grande capital de todas as épocas, decretar: «Agora, não será sob coacção, é mais a ditadura de uma maioria democrática»
Quem procurar, neste processo de raciocínio e neste modelo de «constituição nova», semelhanças com o passado anterior ao 25 de Abril, encontrá-las-á sem grande esforço. E não se trata, obviamente, de pura coincidência.
No que respeita às medidas já aplicadas e às medidas anunciadas pelo Governo, Belmiro de Azevedo mostra-se satisfeito com a prestação de José Sócrates - tanto quanto os trabalhadores se mostram insatisfeitos, naturalmente – e cheio de confiança no futuro, assim dando razão aos que dizem ser este Governo PS/Sócrates o que, nos últimos trinta anos, melhor soube interpretar os interesses do grande capital – o que se sabia constituir tarefa difícil, se tivermos em conta as práticas de todos os governos que o antecederam. Na verdade, achando Belmiro de Azevedo que as medidas já aplicadas «são insuficientes» e que «decisões para mudar o País não houve nenhuma» (mas, isto é ele a falar…), acha, também, e isso é o mais importante, que todo este não fazer de Sócrates é feito «de uma forma premeditada», isto é, «o primeiro-ministro está a fazer isto intencionalmente, numa espécie de sondagem» - assim como quem ajeita o pescoço da vítima para a machadada final. Tudo bem, então: o empresário tem o primeiro-ministro que quer, o primeiro-ministro tem o empresário que o quer. E têm, ambos, a oposição que desejam. E têm, todos, como objectivo único bem servir os interesses do empresário. Eis a democracia deles.