Desemprego em Portugal bate recordes

José Alberto Lourenço
A evolução do emprego e do desemprego em Portugal é medida fundamentalmente através de Inquéritos Trimestrais ao Emprego, da iniciativa do Instituto Nacional de Estatística (INE) e, através da informação mensal do Mercado de Emprego, disponibilizada pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), tendo por base as inscrições efectuadas nos Centros de Emprego existentes no país.
Se no caso das inscrições nos Centros de Emprego é o próprio desempregado que toma a iniciativa de procurar emprego e os Centros de Emprego limitam-se a registar essa situação de desemprego e o consequente pedido de emprego, no caso dos Inquéritos Trimestrais ao Emprego da iniciativa do INE, o desempregado é o indivíduo com idade mínima de 15 anos que se encontre simultaneamente nas situações seguintes:
· não tem trabalho remunerado, nem qualquer outro;
· está disponível para trabalhar, num trabalho remunerado ou não;
· tenha procurado um trabalho, isto é, tenha feito diligências ao longo das últimas quatro semanas para encontrar emprego remunerado ou não.
Qualquer indivíduo que tenha perdido o seu emprego e que não se encontre nas condições acima referidas, não é incluído nos desempregados mas antes é considerado um inactivo.
Os Inquéritos Trimestrais ao Emprego fornecem ainda indicadores complementares que nos permitem apurar, para além do número de desempregados e da respectiva taxa de desemprego obtida nas condições atrás referidas, o número de indivíduos inactivos que pretendem trabalhar e estão disponíveis, mas que não fizeram diligências nas últimas quatro semanas para encontrar trabalho, os chamados inactivos disponíveis e, o número de indivíduos empregados com duração habitual de trabalho inferior à duração normal do posto de trabalho, que declaram pretender trabalhar mais horas, o chamado subemprego visível.
A soma dos inactivos disponíveis para trabalhar e do subemprego visível, com o número de desempregados em sentido restrito, permite-nos obter o número de desempregados em sentido lato e a respectiva taxa de desemprego, que se aproxima mais do verdadeiro nível de desemprego que se verifica hoje no nosso país.
Feita esta introdução metodológica, analisemos agora o nível de desemprego que se regista em Portugal, utilizando para tal dois QUADROS » diferentes, um que apresenta os valores apurados pelos Inquéritos Trimestrais do INE e outro que nos mostra os valores fornecidos mensalmente pelo IEFP.

Agravamento do desemprego

Qualquer que seja a fonte que utilizemos – INE ou IEFP – é claro o agravamento do desemprego, nos últimos meses e anos e, podemos afirmar com algum rigor, que o desemprego em sentido lato, atinge hoje a taxa de 10,4%, a qual corresponde a 579,4 mil trabalhadores desempregados.
O gráfico que reproduzimos, efectuado com base num estudo do Banco de Portugal, apresenta-nos a evolução da taxa de desemprego trimestral, em sentido restrito, desde 1977.
Fica claro pela sua leitura, que a taxa de desemprego trimestral registada no último trimestre de 2005, constitui o valor mais elevado jamais registado no nosso país.
Voltando à análise dos quadros, retira-se da leitura do QUADRO 1 » que o desemprego aumentou 14,8% entre o 4.º trimestre de 2004 e 2005, ou seja mais 57,6 mil trabalhadores perderam o seu posto de trabalho nestes últimos 12 meses. Mas se quisermos verificar com maior rigor o efeito nefasto que o prolongado período de estagnação e recessão económica, que temos vivido desde 2002, tem tido sobre o nível de desemprego registado no nosso país, veja-se que desde o último trimestre de 2000, até ao último trimestre de 2005, o desemprego em sentido restrito mais do que duplicou, passando de 194,8 mil trabalhadores para os 447,3 mil agora registados.
O QUADRO 2 », referente à informação recolhida mensalmente através dos Centros de Emprego, parece indiciar uma desaceleração do crescimento do desemprego nos últimos meses, no entanto a partir do momento em se soube que os últimos resultados apresentados pelo IEFP, foram objecto de manipulação estatística, nomeadamente através da retirada de alguns milhares de trabalhadores da situação de desempregados, para a de empregados, porque foram detectados simultaneamente descontos na Segurança Social, esta tendência carece de confirmação. De qualquer modo, deste mesmo quadro, também se retira a conclusão de que os pedidos de emprego, por razão de desemprego, por insatisfação do actual emprego ou outra, são a variável que mais tem crescido nos últimos anos.
A análise mais aprofundada dos resultados das Estatísticas do Emprego do INE, revela sinais muito preocupantes, sobre os níveis de precariedade do emprego, sobre as classes sociais e género mais afectados pelo desemprego, sobre os sectores produtivos que mais são atingidos pelo seu rápido crescimento e sobre a persistência da situação de desemprego:
· Enquanto em 1998 a percentagem de trabalhadores efectivos, no total dos trabalhadores por conta de outrem, representava cerca de 82,8%, no final de 2005, essa percentagem reduziu-se para 80,5% e só não atingiu valores mais elevados, porque entretanto mais de 50% dos desempregados que procuravam novo emprego, eram trabalhadores contratados a prazo;
· Enquanto a taxa de desemprego masculina era de 7,0% no 4º trimestre de 2005, no mesmo período essa mesma taxa era de 9,2% para as mulheres;
· Enquanto a taxa de desemprego dos jovens era de 10,4% em 1998, no último trimestre de 2005, atingiu os 16,4%, isto é, aumentou mais de 50% ao longo destes últimos anos;
· Enquanto a população desempregada cujas as habilitações são o Ensino Básico, cresceu no último trimestre de 2005, comparativamente com o período homólogo de 2004, 8,6%, no mesmo período a população desempregada com o Ensino Secundário cresceu 38% e com o Ensino Superior aumentou 27% (no último trimestre de 2005 tínhamos 317300 trabalhadores desempregados com o ensino básico, 75900 trabalhadores desempregados com o ensino secundário e 54100 trabalhadores desempregados licenciados).
· Enquanto o emprego no sector primário (agricultura, silvicultura e pesca) registou no último trimestre de 2005, comparativamente com o período homólogo de 2004, uma quebra de 1,8% (diminuíram 10700 postos de trabalho neste sector) e no sector secundário (indústria, construção, energia e água) uma quebra de 1,9%, com destaque aqui para a diminuição do emprego na indústria transformadora (-5,5%) – 56200 postos de trabalho foram reduzidos na indústria transformadora neste período – , no sector dos serviços foram criados 41000 postos de trabalho (+1,4%), insuficientes para compensar as perdas verificadas nos outros sectores produtivos.
· Enquanto no último trimestre de 2004, 182400 trabalhadores encontravam-se no desemprego há mais de 1 ano, representando cerca de 47% do total do nº de desempregados, no final de 2005 esse número era de 225000 trabalhadores e representava já 50,3% dos desempregados.

Todos os trabalhadores fazem falta

Em traços muito ligeiros é este a situação do desemprego, hoje, no nosso país: atingimos em número e em percentagem os valores mais elevado de sempre, temos uma taxa de desemprego dos jovens que é mais do dobro da geral, temos um nível de precariedade laboral dos maiores da Europa – cerca de 20% - (só a Espanha e a Polónia nos ultrapassam), temos o desemprego em trabalhadores com o ensino superior a crescer mais de 20% ao ano e temos o emprego a decrescer no sector primário e secundário e em especial na indústria transformadora.
Este panorama não traduz infelizmente apenas uma difícil conjuntura económica, ele é acima de tudo a expressão social dos graves problemas que a nossa economia atravessa, resultantes das políticas de direita prosseguidas pelos sucessivos Governos, quer do PS, quer do PSD e CDS/PP.
De 2001 a 2007 prevê-se que a nossa economia venha a crescer a uma média de 0,7% ao ano face a 1,7% na chamada Europa dos Quinze, manifestamente muito pouco para aquilo que precisamos de crescer, não só para nos podermos aproximar do resto da Europa, mas para simultaneamente invertermos este ciclo de crescente desemprego (refira-se que para que o desemprego decresça de forma sustentada precisamos de atingir um ritmo de crescimento anual real do Produto Interno Bruto (PIB),superior a 3% ao ano).
Não temos dúvidas de que só uma política diferente nos permitirá sair deste ciclo infernal de recessão, estagnação, défice, dívida e desemprego e para a concretização dessa política todos os trabalhadores fazem falta, todos os trabalhadores hão-de contar.
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