À boleia da insensatez

Jorge Cordeiro
Há os que, por aspirarem a ser aquilo que não são ou simplesmente para afirmarem o que são, gostam de se pôr em bicos de pé. Parece ser o caso do Bloco de Esquerda. Basta passar os olhos pelos textos da sua última convenção para se acreditar que antes deles, à esquerda era o deserto, um completo e insuportável vazio de ideias, acção e coerência. Esteja pois a nação grata pela estrela nova que não só pôs fim ao defensismo, ao imobilismo e à rotina como iluminou a política, lhe deu originalidade e espírito empreendedor.
Como ninguém é perfeito, natural será que o que sobra em originalidade e voluntarismo falte em ponderação e sensatez. É o que parece olhando para as teses sobre a questão europeia. A posição do Bloco sobre a Constituição Europeia assente não só na aceitação mas também na indisfarsável valoração da mesma e da importância que lhe quer atribuir suscita dois comentários.
O primeiro é que só por falta de ponderação ou sensatez se pode admitir como sinónimo de avanço institucional a sua elaboração, no sentido de uma construção europeia que se diz defender, sem olhar se da sua concretização não podem resultar inversamente novos e perigosos mecanismos de aprisionamento na lógica dominante de integração política. Defender com tanto entusiasmo que ao próximo Parlamento Europeu sejam conferidos poderes constituintes sem cuidar de observar a natureza e opções dos que o vão fazer, e depositar tanta expectativa num texto que será assumido não apenas como lei suprema da ordem comunitária mas também da ordem interna de cada um dos Estados membros é no mínimo imponderado.
E também porque, fazendo a justiça de crer que as motivações são seguramente diversas de outros, a verdade é que só por pura ilusão se pode acreditar que o seu desenvolvimento não desembocará no inverso do que se pretenderá alcançar. Objectivamente, a resultante de tal posição será a de dar apoio e energia a um processo sem cuidar de ver quem o conduzirá, em que uns pedalam por avanços institucionais mas outros agarram o volante das políticas. E o mais provável é que à chegada há quem não deixe de agradecer a boleia.
A luta contra o actual rumo do processo de integração e por um novo rumo, conforme os interesses dos trabalhadores e dos povos, para a União Europeia, é sem dúvida complexa. Há que a prosseguir assente no reforço da cooperação das forças progressistas na defesa da soberania e independência nacionais e na luta que em cada país se desenvolve contra a ofensiva do capital e as política neoliberais dominantes da integração europeia.


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