A CONFERÊNCIA DE MADRID

«A Conferência aprovou a ladainha com que Bush justifica o terrorismo que pratica»

Uma «Conferência Internacional sobre Democracia, Terrorismo e Segurança», assinalou o aniversário dos brutais atentados terroristas que, em 11 de Março de 2004, mataram 191 pessoas, em Madrid.
A Conferência contou com a participação de personalidades idas de todas as partes do mundo, algumas delas certamente interessadas e desejosas de combater o terrorismo; outras, nem tanto; outras, ainda, antes pelo contrário – destas últimas podendo dizer-se que, pelas práticas dos governos que ali representavam, deveriam estar a ser julgadas por um tribunal internacional por crimes contra a humanidade, nomeadamente actos de terrorismo tão brutais e selváticos como o de 11 de Março e geradores de um muito mais elevado número de vítimas inocentes. Talvez por isso, a Conferência aprovou uma recomendação à qual se ajusta, como uma luva, o provérbio muita parra e pouca uva. Isto, na mais benévola das leituras – porque uma observação mais fina, susceptível de desvendar o real conteúdo da parra e da uva, poderá conduzir a conclusões outras e bem mais graves. Do caudaloso conjunto de declarações de intenções que é a recomendação da Conferência, emerge, como medida maior e mais sonante, «limitar a proliferação de armas de destruição maciça, investigar os países suspeitos de apoiarem redes de terror e privar as organizações terroristas de meios financeiros» – ou seja: a Conferência aprovou a ladainha com que Bush justifica os actos de terrorismo que o Governo dos EUA tem vindo a praticar.

Como se sabe, foi invocando aqueles objectivos que o Governo norte-americano invadiu, destruiu e ocupou o Afeganistão, na sequência (e alegadamente em resposta) do ataque às Torres Gémeas e ao Pentágono – brutal acto terrorista cujas origens essenciais permanecem ocultas (ou talvez não tão ocultas como parecem…) sendo certo, no entanto, que o atentado terrorista de 11 de Setembro de 2001, viria a fornecer ao imperialismo norte-americano as justificações de que necessitava para, em nome do combate ao terrorismo, dar perigosos passos em frente na sua política terrorista de expansionismo a ferro e fogo.
Foi, igualmente, invocando esses objectivos definidos pela Conferência de Madrid que o governo de Bush invadiu, arrasou e ocupou o Iraque, numa operação que constituiu um outro verdadeiro acto de terrorismo internacional. A existência de «armas de destruição maciça no Iraque» e «o apoio do regime iraquiano ao terrorismo internacional» – com provas apresentadas por Bush e Blair, e garantidas como verdadeiras por Aznar, Barroso e outros… – foram o pretexto para uma das mais cruéis carnificinas, responsável pela morte de centenas de milhares de pessoas inocentes.
E é invocando esses mesmos objectivos que o imperialismo norte-americano se prepara para levar o terror a vários outros países.

O chamado «combate ao terrorismo» tem sido igualmente aproveitado para reduzir ou eliminar liberdades, direitos e garantias dos cidadãos, quer nos Estados Unidos da América, o maior centro de terrorismo actualmente existente, quer noutros países da Europa e do resto do mundo. O modelo norte-americano é clássico: prisões indiscriminadas, torturas, sujeição dos presos a condições inumanas que só encontram equivalência com o que ocorria nas prisões do nazi-fascismo, aprovação de leis que dão ao Governo de Bush luz verde para prender, matar, invadir, destruir, ocupar, fazer o que quiser, onde quiser, como quiser, à margem das leis internacionais – tudo em nome da democracia, da liberdade, dos direitos humanos, valores que, nesta concreta situação, se resumem às três palavras mágicas: «combate ao terrorismo». A esse modelo, corresponde Blair com uma não menos clássica «lei antiterrorista», esfacelando a democracia, retirando aos cidadãos «direitos fundamentais, alguns deles inscritos nas leis britânicas há 700 anos.», chantageando com argumentos de tirano os que ousam opor-se à sua sanha persecutória e repressiva - Blair conivente nos crimes perpetrados por Bush e, como ele, com as mãos manchadas de sangue: o sangue de centenas de milhares de homens, mulheres e crianças, cujo único crime foi terem nascido e viverem em países alvos preferenciais da cobiça e das ambições imperialistas de domínio do mundo.

O conceito de terrorismo de Bush abarca tudo e todos os que recusam o domínio planetário por parte dos Estados Unidos da América; tudo e todos os que recusam abdicar da sua soberania, da sua independência, do seu direito de decidirem os seus próprios destinos; tudo e todos os que recusam considerar sacrossantos os interesses dos EUA. Pelo que, os protagonistas destas recusas estão condenados a alvos do terrorismo de facto praticado pelo Império.
Na Conferência de Madrid, o secretário-geral da ONU avançou com uma pertinente definição de terrorismo: «é terrorismo qualquer acto com a intenção de causar a morte ou ferir gravemente civis ou não combatentes, com o objectivo de intimidar uma população ou obrigar um Governo ou uma organização internacional a cumprir um acto ou a abster-se de o fazer.» Percebem-se os rodeios e cautelas em que Kofi Annan envolveu a sua definição de terrorismo e o cuidado que teve em se abster de falar de terrorismo de estado: é que, aceite tal conceito, isso implicava o julgamento e a condenação de vários dos presentes na Conferência e de muitos outros que lá não estavam, a começar por Bush e Blair. E, nessas circunstâncias, quem é que iria pôr o guizo ao gato?