A riqueza de um país são as pessoas

Sem educação não há desenvolvimento

Eugénio Rosa
A principal fonte de criação de riqueza de um país são as pessoas, e nomeadamente os seus conhecimentos e qualificações. O nível de escolaridade de uma população é precisamente a infraestrutura básica que permite, facilitando ou dificultado, a aquisição permanente de novos conhecimentos e competências tão necessária no mundo actual. E isto porque os conhecimentos estão em rápida mudança, e necessitam de ser continuamente actualizados. O baixo nível de escolaridade constitui, por isso, um sério obstáculo a essa actualização permanente tão necessária.
O Quadro I, construído com base em dados divulgados recentemente pela OCDE, mostra como Portugal se atrasou nos últimos 11 anos.
De acordo com os referidos dados, entre 1991 e 2002, a população portuguesa potencialmente activa (idade entre os 25 e 64 anos) com o ensino básico ou menos diminuiu apenas 6 pontos percentuais (6 pp), enquanto a redução na média dos países da OCDE atingiu 12 pontos percentuais (12 pp), ou seja, o dobro do verificado em Portugal.
Esta situação é ainda mais grave, se se tiver presente, como mostram também os dados do Quadro I, que no ponto de partida considerado – ano de 1991 – Portugal encontrava-se já numa posição muito mais desfavorável que a média dos países da OCDE.
Em 1991, 86% da população portuguesa tinha apenas o ensino básico ou menos, enquanto a média nos países da OCDE era de 45%. Em 2002, a média da OCDE tinha baixado para 33%, enquanto em Portugal a população com o ensino básico ou menos era ainda 80% do população total com idade entre os 25 e 64 anos.
Se se analisar a evolução verificada em Portugal, agora por governos, conclui-se o seguinte:
a) Na primeira fase (91-95), a percentagem referida anteriormente diminuiu 6 pontos percentuais com governos do PSD;
b) Depois, (95-2001) com os governos do PS a percentagem da população com apenas o ensino básico ou menos manteve-se inalterável em 80% apesar da «paixão da educação»;
c) Com os governos do PSD/PP manteve-se também sem qualquer alteração.
Em relação à população com o ensino secundário a situação em 2002 era também preocupante, pois apenas 11% da população portuguesa, com idade compreendida entre os 25 e 64 anos, possuía esse nível de escolaridade, enquanto a média dos países da OCDE atingia 44%, ou seja, quatro vezes mais. E como se sabe, uma população com o ensino secundário é fundamental para o rápido crescimento económico de um País, já que ela é a principal fonte de quadros médios.
Finalmente, a percentagem da população com o ensino superior aumentou, entre 1991 e 2002, portanto em 11 anos, apenas 2 pontos percentuais, pois passou de 7% para 9%. E este fraco crescimento ainda se torna mais claro quando se compara com a evolução verificada na média dos países da OCDE. Esta média aumentou, no mesmo período, 5 pontos percentuais nos países da OCDE, atingindo a população com o ensino superior em média, no ano 2002, 23%, ou seja, cerca de 2,6 vezes superior à percentagem portuguesa.
Igualmente grave é a qualidade dos conhecimentos da população com o ensino superior. De 1991 a 2002, saíram das universidades portuguesas 429 638 licenciados. No entanto, apenas 35 806, ou seja, 8,2% foram da «área das Tecnologias». Por ex., nas Ciências da Educação o crescimento foi mais do dobro, pois o número de licenciadas que saíram das universidades portuguesas atingiu 73 948, o que corresponde a 17,2% de todos os licenciados deste período. E muitos deles ou foram para o desemprego ou tiveram de exercer outras profissões pois não existem no ensino número suficiente de lugares para eles.

A perpetuação da baixa escolaridade nas idades mais jovens

Um outro aspecto grave é a elevada percentagem de população com idade compreendida entre os 25 e 34 anos - portanto, que fez a sua escolaridade depois do 25 de Abril - que possui apenas o ensino básico ou menos. O Quadro II mostra a evolução verificada.
Embora a população com o ensino básico ou menos com idade compreendida entre os 25 e 34 anos tenha diminuído em Portugal, entre 1991 e 2002, em 14 pontos percentuais, mesmo assim no ano 2002 ela ainda representava 65% da população total com esta idade (a média nos países das OCDE é apenas 22%, o que corresponde a um terço do verificado em Portugal).
É evidente que se verifica em Portugal uma perpetuação da baixa escolaridade, certamente causada pelo elevado abandono escolar prematuro que atinge, em Portugal, 45,5% da população com idade até aos 24 anos, quando a média na União Europeia ronda os 18,8%, sendo inferior nos países que aderiram a ela em Maio de 2004.
Se se analisar a evolução por governos, conclui-se que a diminuição mais reduzida verificou-se durante o governo PS. Assim, a população com idade compreendida entre os 25 e 34 anos com o ensino básico ou menos diminuiu 10 pontos percentuais durante 14 anos de governos Cavaco Silva (0,7 ao ano) e apenas 2 pontos percentuais durante 6 anos de governo Guterres ( 0,3 ao ano).

Influência do nível de escolaridade no rendimento individual

A OCDE utiliza uma taxa, a que chama Taxa de Rendimento Interna Privada do Investimento na Educação (TRIPIE), para medir a influência do nível de escolaridade nos rendimentos auferidos por cada indivíduo.
Segundo a OCDE, «esta taxa mede o benefício do custo do investimento inicial feito na educação, e é calculada tendo em conta a duração da vida dos indivíduos que atingem diferentes níveis de formação durante a sua adolescência e o início da sua vida adulta» (pág. 179 e 180, Regards sur l´Education, OCDE 2004).
O Quadro III contém os resultados dos estudos feitos neste campo pela OCDE em diferentes países.
Os dados mostram que, em Portugal, um indivíduo com o secundário completo ganha, em média, 60% mais do que um indivíduo que não possua este nível de escolaridade; e que um indivíduo com o ensino superior ganha, em média, mais 190% do que um indivíduo que não tenha o ensino secundário.
Nos restantes países constantes do Quadro, embora as diferenças não sejam tão grandes, elas também são significativas. Por exemplo, na Irlanda um indivíduo com o ensino secundário completo ganha, em média, apenas mais 10% do que um indivíduo que o não tenha; e um indivíduo que possua o ensino superior ganha, em média, mais 70% do que um indivíduo que não possua o secundário completo. Na Inglaterra, as diferenças já são maiores, pois atingem respectivamente, 50% e 140%.
O que é claro nos resultados dos estudos realizados pela OCDE é que se verifica em todos os países uma correlação positiva entre nível de escolaridade e rendimento auferido por cada indivíduo, ou seja, quanto mais elevado é o nível de escolaridade maior é o rendimento auferido.
O inquérito realizado pelo INE em 2000 às receitas das famílias portuguesas confirma essa forte correlação que existe entre nível de escolaridade e nível de rendimento individual, como mostram os dados do Quadro IV.
Assim, tomando como base a receita total do agregado familiar, um agregado cujo representante possua o nível de instrução superior tem em média uma receita 5,2 vezes superior à receita de um agregado cujo representante não tenha qualquer nível de instrução, e 2,4 vezes superior à receita média de um agregado familiar cujo representante possua o 2º ou 3º ciclo básico.
Mas se a análise for feita tomando apenas como base de comparação a receita do agregado que tem como origem o Trabalho por Conta de Outrem (TCO) a disparidade ainda é maior. Nesse caso, a receita do agregado familiar cujo representante tem o nível de instrução superior é 10,6 vezes superior à do agregado cujo representante não tem «nenhum nível de instrução» , e 2,5 vezes superior à do agregado cujo representante tem o ensino «do 2º ou 3º ciclo Básico».
Com base na metodologia proposta pela OCDE haveria que comparar os diferentes investimento feitos por diferentes indivíduos com níveis de escolaridade diferentes com os diferentes ganhos obtidos por cada um deles durante a sua vida activa útil (por ex., 40 anos), devendo ser os valores quer da despesa (investimento inicial) que tiveram de suportar com a sua educação escolar inicial quer dos ganhos obtidos durante 40 anos de vida activa actualizados (uns e outros) para o mesmo ano, a fim de os valores poderem ser depois comparados.
Mas os dados dos quadros anteriores mostram já que, em termos individuais, o retorno obtido pelos indivíduos resultante do investimento na sua educação escolar inicial é mais do que proporcional.

Influência do nível de escolaridade no crescimento económico de um país

A OCDE utiliza uma outra taxa, a que chama Taxa de Rendimento Interna Social de Investimento na Educação (TRISIE) para medir o benefício para o país (aumento da produção) do investimento que realiza na educação.
Assim, de acordo com estudos feitos pelas OCDE, «nos países da OCDE, o efeito a longo prazo de um ano de estudos suplementar sobre a produção é estimada entre a 3 a 6%» (pág. 196, Regards sur l ´Education OCDE 2004); portanto, por cada ano de escolaridade a mais corresponde, em média, nos países da OCDE um aumento de produção por indivíduo que se calcula entre 3% e 6%.
O Quadro V mostra o aumento da produtividade que se obteria com um aumento do nível geral da escolaridade da maioria da população portuguesa, em que actualmente cerca de 80% possui apenas o ensino básico ou menos como se mostrou anteriormente.
Como mostram os dados deste Quadro, que foram calculados a partir dos dados obtidos pela OCDE nos estudos que realizou em vários países que referimos anteriormente, um trabalhador com o ensino secundário completo produz entre 39,8% e 46,9% mais do que um trabalhador apenas com o ensino básico; e um trabalhador com o ensino superior produz em média entre 114,5% e 145,7% mais do que um trabalhador apenas com o ensino básico.
É evidente que, se se quiser aumentar a produtividade em Portugal de uma forma sustentada, é necessário aumentar o nível de escolaridade geral da população portuguesa (trabalhadores mas também patrões).
Pensar que é possível aumentar a produtividade de uma forma sustentada e generalizada em Portugal através de «choques», sejam eles «fiscais», «tecnológicos» ou de «gestão», é tomar o desejo pela realidade, é enganar os portugues