- Nº 1615 (2004/11/11)
Prossegue a discussão das Teses

Um debate profundo e alargado

PCP
Por todo o País, em centenas de reuniões, plenários e debates, discutem-se as Teses a levar ao XVII Congresso do Partido, que se realiza no fim do mês, em Almada. Nestes, milhares de comunistas contribuem com as suas opiniões e pontos de vista para a definição das análises e orientações.

Albano Nunes esteve, na passada sexta-feira, dia 5, no Seixal, para debater o primeiro capítulo das Teses, «A Situação Internacional». Para o membro do Secretariado, «todos os congressos são importantes, mas este tem uma importância particular», pelo momento em que se realiza: Numa situação internacional «instável e perigosa», com uma União Europeia em marcha acelerada para o federalismo, e com um País dirigido pelo governo «mais reaccionário a seguir ao 25 de Abril». Tudo isto coloca ao PCP, afirmou, fortes responsabilidades.
Perante uma assistência interessada e participativa de cerca de 80 pessoas, Albano Nunes fez ainda outro apelo: para que os militantes enriqueçam o projecto de resolução política, através das opiniões que exprimem nas reuniões e debates, mas sobretudo através de propostas de alteração escritas.
Os presentes responderam ao apelo e, após uma primeira exposição do dirigente do Partido, colocaram as suas opiniões e perguntas, concordâncias e discordâncias, e propostas para colmatar o que consideravam lacunas no documento. Albano Nunes comentou todas as intervenções e nenhum assunto, por mais delicado e complexo que fosse, ficou sem resposta por parte do responsável pela Secção Internacional do Partido.
A crise actual do capitalismo é uma «crise sistémica», afirmou o dirigente do PCP, que chamou a atenção para alguns dos seus traços: A fuga dos capitais da esfera produtiva para a especulativa, o aumento do desemprego nos países industrializados, a baixa do poder de compra dos trabalhadores ou o peso crescente que assumem as economias paralelas e criminosas no funcionamento do sistema.
Mas Albano Nunes lembrou: «O capitalismo está objectivamente em crise, mas não cai de podre.» E destacou a necessidade de reforço dos partidos comunistas e forças revolucionárias para suprir a discrepância existente entre as condições objectivas para a ocorrência de alterações sociais profundas e a capacidade actual das forças que podem realizar e conduzir essas transformações.

Ofensiva generalizada

Seguindo as Teses, Albano Nunes destacou a violenta ofensiva do capitalismo, que se intensificou após a alteração da correlação de forças decorrente da derrocada da União Soviética e o fim do Socialismo no Leste da Europa. Mas, realçou o dirigente do Partido, a sua verdadeira origem reside na própria natureza do capitalismo e na sua incapacidade para resolver os grandes problemas da Humanidade.
Ainda sobre a ofensiva, Albano Nunes destacou a variedade dos métodos utilizados: agressão militar directa, como no Iraque ou no Afeganistão, ingerências e provocações, como Cuba ou Venezuela. Generalizado está o agravamento da exploração dos trabalhadores e dos povos e a entrega aos grandes grupos económicos de fundamentais – e rentáveis – funções sociais do Estado, resultantes das grandes conquistas dos trabalhadores no século XX: Nos Estados Unidos, na Europa, e por todo o mundo.
Lembrando que a correlação de forças actual é favorável às forças do imperialismo, Albano Nunes afirmou que os tempos não estão fáceis para os comunistas. Mas, realçou, há que reforçar o Partido, através do trabalho colectivo, e combater «desânimos e voluntarismos». E reafirmou uma convicção profunda: «Acabaremos por triunfar!»

Exemplos de resistência

Para Albano Nunes, uma das teses fundamentais do primeiro capítulo é a constatação de que se vive uma época de resistência e acumulação de forças, mas ao mesmo tempo de reais potencialidades revolucionárias. As expressões da resistência são variadas, e o dirigente do PCP realçou algumas, suscitadas por questões levantadas.
O papel da China no mundo foi uma delas. Albano Nunes, lembrando que nas Teses não se analisam experiências concreta de construção do Socialismo, concorda que a China é uma força de contenção do imperialismo. E afirma mesmo que é, actualmente, o adversário principal dos Estados Unidos, lembrando o bombardeamento à embaixada chinesa em Belgrado, durante a agressão à Jugoslávia, as diferentes acções de espionagem, a militarização da Península da Coreia e da Formosa.
Não escondendo as reservas que o Partido mantém relativamente a alguns aspectos da experiência chinesa, o dirigente do PCP lembra que em pouco mais de 50 anos foram resolvidos alguns problemas fundamentais daquela sociedade, que conheceu um impressionante desenvolvimento desde a Revolução.
A Palestina foi outro dos temas em destaque. Caracterizando o povo palestiniano como «heróico», relatou as atrocidades de que é alvo diariamente e a tenacidade com que combate o invasor. Recordando que a criação do estado de Israel em 1948, com apoio das potências imperialistas ocidentais, provocou a expulsão de muitos palestinianos – que eram a maioria dos habitantes do estado judaico –, Albano Nunes lembrou que há muita gente em Israel que luta pela paz e pela existência dos dois estados. E destacou o papel do Partido Comunista de Israel, que tem presença no Parlamento e dirige, por exemplo, o município de Nazaré.
Resistência ao imperialismo é, hoje, sinónimo de Venezuela. Daí não admirar que esta experiência tenha sido também referida por vários participantes. O dirigente do PCP, considerando a Venezuela bolivariana um verdadeiro «laboratório», reafirmou a necessidade de lhe prestar solidariedade. Albano Nunes lembrou que o Partido Comunista da Venezuela participa no processo – tendo mesmo membros no governo – e já foi um grande partido, que sofreu muito às mãos da repressão. Mas é um partido muito respeitado.

José Casanova debate alternativa
«Uma luta difícil, mas fascinante»

«A alternativa que Portugal necessita» foi o tema que o director do Avante!, José Casanova, abordou em Almada, perante uma plateia atenta e participativa de mais de uma centena de pessoas. Lembrando que a luta por esta alternativa começou logo no final dos anos 70, por alturas do primeiro governo constitucional, chefiado por Mário Soares, o membro da Comissão Política do PCP afirmou que «temos lutado por ela e ainda não a conquistámos». Para José Casanova, esta é uma luta «difícil, mas fascinante»!
Baseado nas Teses apresentadas ao Congresso, o dirigente do Partido destacou que para que se concretiza esta alternativa é necessário estarem reunidas uma série de condições: O crescimento da luta de massas, nomeadamente dos trabalhadores, é uma das principais, assim como o reforço da influência do Partido, a começar pelas empresas e locais de trabalho. «Nada substitui o espaço da célula do Partido numa empresa», afirmou. Mas, ressalvou, é necessário também intervir noutros espaços.
Para o membro da Comissão Política, as lutas que se travam todos os dias contra as diversas medidas injustas dos governos deverão convergir na exigência de uma nova política, radicalmente diferente desta. Esta é, sustentou, uma das grandes tarefas dos revolucionários. E lembrou: «Nós estamos em todas as lutas que se travam de norte a sul do País».
E exemplificou com o movimento sindical. «Na CGTP há muitos comunistas, não devemos ter medo de o dizer. Mas não estão lá por nenhuma estratégia nossa. Estão lá porque merecem a confiança dos trabalhadores que os elegeram, e que os vêem sempre à frente das lutas.»
Para José Casanova, é fundamental, nas muitas lutas diárias, não perder de vista o objectivo mais geral, o da alternativa de esquerda, também ela integrada num outro, ainda maior, o da construção de uma democracia avançada.

A «velha» questão

O PS e a sua política foi um dos temas mais debatidos na fase das intervenções do público, o que, aliás, não surpreende. A questão surge sempre que se fala de alternativa política no quadro das instituições. Para José Casanova, também para este caso a solução passa pelo incremento da luta de massas a um nível muito elevado. Só assim se poderá pensar em «empurrar» o PS para uma outra política, diferente.
Confrontado com a opinião de um militante, que discordava da formulação das Teses, que falam da «direita e do PS», o director do Avante! lembrou que já há muitos anos, desde o final dos anos 70, que o PCP deixou de considerar o PS como um partido de esquerda, preferindo a formulação «partido democrático».
Para José Casanova, a política de esquerda que o PCP defende enfrenta um «triplo obstáculo: o PSD, o PP e o PS», que praticam, há décadas, políticas de direita. Apesar disto, reafirmou José Casanova, o PCP continuará o seu labor pela convergência das várias forças para que seja, finalmente, posta em prática uma política de esquerda. Mas, alertou, «não confundimos oposição a um governo com oposição à política de direita» e o esforço com vista à convergência prosseguirá, a par da denúncia do papel do PS e das suas opções. «A nossa oposição é diferente da dos outros. Não a fazemos com o objectivo apenas de derrotar o governo, mas de simultaneamente derrotar a política de direita.»
Uma coisa é certa, destacou o membro da Comissão Política: «Nunca seremos a cereja de esquerda no bolo da política de direita.» A luta por uma nova política continuará. «E não desesperaremos se demorar muito tempo», reafirmou. Os presentes concordaram e aplaudiram.

Colectivo militante é a força do Partido

Para José Casanova, não há democracia plena sem participação. Quer se esteja a falar de um congresso partidário ou de um país. E de participação não recebe o PCP lições de nenhum outro partido nacional, destacou o director do Avante!.
Considerando o PCP um partido «único no panorama nacional», o membro da Comissão Política atribui esta singularidade à sua forma de funcionamento interno. No PCP, destacou, não há líderes e o colectivo sobrepõe-se ao individual. «Um Partido que quer transformar a sociedade não se pode organizar da mesma forma do que os que apenas pretendem gerir o sistema», afirmou o dirigente comunista, lembrando que já Lenine dizia isto, há mais de cem anos atrás.
Sobre a eleição do secretário-geral, José Casanova destacou uma diferença entre o PCP e o PS: «Nós não elegemos o “chefe” do Partido, mas sim o seu “rosto”, que se integra no colectivo.» Logo, «ser secretário-geral do PS é uma benesse, já ser secretário-geral do PCP não é». Referindo-se à campanha anticomunista, difundida pelos principais órgãos de comunicação social, José Casanova acusou-a de pretender «condicionar a discussão interna do Partido». A melhor resposta a esta ofensiva é, para o dirigente comunista, o reforço da consciência de classe dos membros do Partido.
Para o director do Avante!, a força do Partido assenta no seu ideal transformador e no relacionamento fraterno entre camaradas. Precisamente aquilo que PSD, PP e PS pretendem atacar com a lei dos partidos, que interfere com a liberdade de organização partidária. Mas os comunistas estão-se a mobilizar contra esta lei, que considera antidemocrática e anticonstitucional.
«Querem derrotar o PCP, porque é o único que impede a política de direita de “cavalgar à rédea solta”», afirmou. Neste combate contra esta política, «sofremos derrotas. Mas nunca os inimigos nos viram pelas costas, a fugir. Olhamos sempre de frente os nossos adversários».