- Nº 1572 (2004/01/15)
Aprovada agora em Conselho de Ministros, foi introduzida em Setembro

Reforma do secundário está a ser aplicada ilegalmente

Juventude
Aprovada em Conselho de Ministros no passado dia 8, a reforma do ensino secundário já faz parte do quotidiano dos estudantes desde o início do actual ano lectivo.

A reforma do ensino secundário foi aprovada em Conselho de Ministros na semana passada e entra oficialmente em vigor no próximo ano lectivo para o 10.º ano. No entanto, alguns dos seus conteúdos estão a ser aplicados desde Setembro, nomeadamente parte da matéria e a blocos de aulas de 90 minutos no 10.º, 11.º e 12.º anos.
João Fernandes, membro da Comissão Política da JCP, considera que esta situação se deve em parte ao negócio das editoras dos livros escolares. «Os livros já estavam feitos e o Ministério da Educação decidiu aplicar já este ano a reforma, antes de ser aprovada. Podemos considerar isso como ilegal. O facto de introduzir uma reforma antes de discutir com todos os parceiros educativos, mostra a posição autista do Governo, nomeadamente na discussão com os estudantes», sublinha o dirigente.
Para a JCP, esta reforma constitui «uma grave ofensiva à educação pública, gratuita e de qualidade, através do reforço da autonomia das escolas e de gestores profissionais, ou seja, gestores privados nomeados pelo Ministério da Educação». Entre as consequências previsíveis, está o aumento dos preços e o fim dos materiais gratuitos nas escolas. «Os gestores privados tanto podem estar a tomar conta de uma empresa hoje, como vir gerir uma escola amanhã e o seu objectivo essencial não será visar as necessidades e os anseios dos estudantes, mas sim o lucro.»

Menos horas?

Um dos aspectos mais criticados pelos jovens comunistas é a progressiva elitização do ensino. «Isso é visível na forma como são divididas as modalidades, umas canalizando os estudantes para irem para o ensino superior, outras reforçando a entrada precoce no mercado de trabalho. Esta via tem um carácter demasiado técnico. Que direito têm os estudantes que vão para o ensino superior a ter mais formação, por exemplo, no Português, quando todos devem ter acesso a boas aulas da nossa língua?», questiona João Fernandes.
Na avaliação são aumentadas as barreiras eliminatórias, nomeadamente com o fim da segunda fase e com a nota mínima de 9,5 valores nos exames nacionais de 12.º ano das disciplinas específicas. «Esta nota mínima não tem em conta o trabalho anterior. Andámos três anos a estudar e isso só vale 50 por cento. Chagamos a um exame de duas horas, as coisas podem não correr bem até por causa do cansaço e do stress, mas essa nota vale 50 por cento da média», especifica.
O Ministério da Educação prevê a redução da carga horária de 30,5 para 25,5 horas semanais, com a coexistência de aulas de 90 e 45 minutos, estas de carácter complementar. Contudo, se «estas aulas servem para ajudar os estudantes e deveriam ter um número limite, em várias escolas os estudantes estão a ser obrigados a assistir a muito mais aulas do que as estipuladas». Ou seja, a carga horária não é diminuída.
Também a existência de aulas de 90 minutos é criticada pela JCP. «As escolas não têm materiais para que estas aulas sejam mais rentáveis. Os professores admitem que não estão preparados e os programas não são adequados. Há muita gente que se satura e perde a capacidade de concentração a meio da aula»,
Outra medida prevista na reforma são os estágios nos cursos tecnológicos a partir do 10.º ano. Os jovens comunistas valorizam a importância dos estágios, mas alertam para a participação que as empresas privadas podem vir a ter nas escolas. «É como se o estudante estivesse a trabalhar na empresa, mas sem receber nenhum tipo de pagamento. Vai estar a produzir para a empresa, não vai apenas ver como é que funciona», comenta João Fernandes.
A JCP considera que os estágios também são importantes nas modalidades não tecnológicas. «Todo o estudante deve saber mais sobre a profissão que acha que vai ter. Se quer serralheiro, é importante que conheça os aspectos da serralharia enquanto estudantes, tal como quem quer seguir medicina deve ter direito a conhecer os hospitais.

Encontro de AEs dia 24

No dia 24 de Janeiro tem lugar um novo Encontro Nacional de Associações de Estudantes do Ensino Básico e Secundário, na Escola António Arroio, em Lisboa. O objectivo é discutir a reforma curricular e reforçar a sua contestação.
«Se o Governo tivesse interesse em escutar as associações de estudantes, a reforma seria diferente. Se não mostra interesse, há que arranjar outras formas de dar combate a estas medidas, nomeadamente com o esclarecimento e mobilização dos estudantes nas escolas e de lutas de dimensão nas ruas», considera João Fernandes.
O papel da JCP é muito importante. «Temos de estar empenhados no reforço da unidade entre as associações de estudantes. Está nas mãos dos estudantes e das AEs combater esta situação. Esta é a tarefa prioritária dos comunistas dentro das escolas, participando no movimento associativo», refere o dirigente.
Durante o primeiro período, 3 mil estudantes manifestaram-se em Aveiro, 600em Lisboa e 400 no Porto e em Gaia, exigindo não apenas a suspensão da reforma curricular, mas também a melhoria das condições das escolas, a aplicação da educação sexual e um novo sistema de acesso ao ensino superior.