ANGOLA
Até quando?


Angola vive um dos muitos graves conflitos que varrem todo o continente africano. Pela sua extensão, localização e riquezas Angola tem uma enorme importância estratégica. Em grande medida tais factores explicam o estado de guerra que o país vive há mais de trinta anos.
O conflito angolano tem, desde logo, uma carga explosiva enorme, dado o facto da UNITA/Savimbi continuar a poder abastecer-se do mais sofisticado armamento, contrariando decisões do Conselho de Segurança que decretaram o embargo de venda de armas à UNITA bem como a proibição de compra de diamantes vendidos por aquela organização.
A UNITA utiliza todo o seu poder militar para não só em Angola mas também dentro das fronteiras do Congo Kinshasa, do Congo Brazaville, da Namíbia e da Zâmbia. Apoia os movimentos que combatem os governos de Kabila, de Nguesso, de Nujoma, respectivamente no Congo Kinshasa, no Congo Brazaville e na Namíbia porque está interessada que nestes países existam governos que lhes permitam utilizar aqueles territórios para combater o governo angolano.

À custa dos diamantes, do marfim e de outras riquezas a UNITA conseguiu recrutar e manter um exército cuja importância lhe permite movimentar-se dentro e fora das fronteiras de Angola.
Ora esta situação só é possível porque há países, círculos económicos e políticos em África, na Europa e nos EUA que apoiam a UNITA. E países e círculos suficientemente fortes para influenciar o Conselho de Segurança da ONU a ponto de este órgão, na prática, não tomar qualquer medida que impeça a UNITA de continuar a armar-se.
A situação é terrível. O povo angolano sofre décadas após décadas. A fome e a doença campeiam. Ninguém de boa fé pode deixar de concordar que a guerra é a causa principal desta catástrofe humanitária. Não pretendemos passar o pano por cima de outros problemas sociais que resultem de erros e graves faltas na condução do país, mas ninguém pode esquecer que se trata de uma guerra imposta, em flagrante violação de decisões do Conselho de Segurança.

O reaparecimento de Jonas Savimbi através de várias entrevistas inserem-se numa tentativa de branqueamento da UNITA e criar condições, a partir de posições militares fortes no terreno, de impor novas negociações que lhe dessem maior peso no xadrez político angolano. É, por isso, condenável o modo como o Conselho de Segurança e a comunidade internacional têm lidado com o dossier angolano. São decretadas algumas sanções que não se cumprem. São adiadas sanções mais drásticas. E por força dos EUA há uma oposição a novas sanções, pois os EUA entendem que o problema se resolve através de negociações e não de acções militares ( no Público de 14.01.99). Ora neste contexto a UNITA sente as costas quentes para atacar em Angola, para se juntar aos rebeldes namibianos na faixa de Caprivi, e aos rebeldes do Congo Kinshasa e do Congo Brazaville.
Cheia de dinheiro e de armas a UNITA joga na desestabilização de toda a região, sabendo que essa desestabilização agrava o clima de guerra que Angola vive.

A ONU levou as partes do conflito às negociações que conduziram ás eleições e a novas negociações e ao acordo de Lusaka. É a própria credibilidade da ONU que está em causa. Negociar o quê? Quem violou o espírito de todas as negociações foi a UNITA. Pode agora aceitar-se que a UNITA se rearme, recrute um enorme exército e imponha pela força das armas a sua vontade, desprezando totalmente as eleições realizadas? É inaceitável. Em Angola e em qualquer outro lado. São centenas e centenas de milhares de desalojados por força das acções militares da UNITA.
O povo angolano necessita de paz e para haver paz é necessário que se respeitem os acordos celebrados e que a UNITA se desmilitarize e se integre na vida civil ou se continuar as acções militares, que se lhe dê combate e a obrigue a respeitar o que ela própria acordou. Não há outro caminho. — Domingos Lopes


«Avante!» Nº 1343 - 26.Agosto.1999