Isto promete!
Decididamente, estragam-nos com mimos e
matam-nos com alegrias.
Com efeito, ao ouvirmos Durão Barroso falar indignadamente
contra o facto de 10% dos agricultores receberem 90% das ajudas
comunitárias, é impossível não ver nisso a reconfortante
confirmação de como são poderosas e eficazes as nossas
acções de esclarecimento, as nossas conferências de imprensa e
os nossos folhetos, incluindo o que distribuímos aos
agricultores na campanha para o Parlamento Europeu e que, quem
sabe, talvez tenha permitido ao líder do PSD descobrir agora o
que o seu partido nunca quis descobrir em mais de uma década.
E, entre tantos outros exemplos, é essa mesma sensação que nos assalta quando vemos Paulo Portas a clamar pela baixa para os 62 anos da idade da reforma das mulheres, apesar do que cruelmente consta do nº 61 do «Diário da Assembleia da República» (de 24.4.96) sobre a forma como o CDS-PP ( e o seu deputado Paulo Portas) votaram no fim da discussão do projecto de lei do PCP que repunha essa idade.
Bastariam estes dois exemplos para nos permitir umas modestas mas gostosas reflexões sobre como é possível que um partido - o PCP- sempre tão acusado de falta de ideias e de perda de contacto coma realidade gostosas se veja agora, por via do plágio das suas denúncias e da cópia atrasada das suas reclamações e propostas, convertido sem o querer em «partido guia» ou mesmo «partido farol» de outros partidos.
Mas é melhor esperar mais um pouco. Pelo
rumo que as coisas estão a tomar, ainda não perdemos a
esperança de, antes de 10 de Outubro, vermos o PSD e o PP a
falar até da necessidade de aumentar os salários dos
trabalhadores, ou seja, precisamente sobre a matéria a respeito
da qual, nos últimos quatro anos, não deram o mais pequeno pio.
Mais: como o espectáculo da falta de vergonha e de escrúpulos
promete crescer exponencialmente, também ainda não perdemos a
esperança de ver António Guterres a proclamar que a grande
tarefa para o inicio do novo século é restringir os ofensivos
privilégios e poder dos senhores do dinheiro e defender,
revalorizar e dar nova dimensão aos direitos e aspirações do
mundo do trabalho.
Entretanto, e enquanto não fica completo
este cabaz da demagogia e da amnésia, só nos resta propor
sobretudo ao PS, mas também ao PSD e ao PP que em parte menos
igualmente o merecem, que para variar se apropriem de um feito
glorioso de que o PCP não se reclama mas que honra a política
dos outros três partidos.
É que, com a testa ainda mais franzida do que é costume, lemos
no «Semanário Económico» (de 20/8) que «Lucros da banca
disparam mas impostos caem 23%», que as taxas médias de IRC
pagas pelos bancos têm vindo a descer de ano para ano e que,
grande imagem de marca da governação do PS, o BCP, apesar do
crescimento espectacular dos lucros, deverá pagar este ano uma
taxa de IRC de 10%, ou seja uma taxa bastante inferior à que
paga de IRS um trabalhador mal remunerado!
PS: Na terça-feira, nas televisões, com Durão Barroso a autoqualificar-se de «líder da oposição» e Guterres a chamar isso mesmo àquele, prosseguiu uma velha fraude semântica e política. Sabemos que nem a violência da linguagem os fará ter tento na língua e senso na tola. Mas, ainda assim, insistimos: é triste ver os líderes do PS e do PSD a persistirem numa falsificação que só pode ser filha ou de estupidez, ou de má-fé, ou de desonestidade. Façam favor de escolher. Vítor Dias