Alemanha
Contestação no SPD
à política de Schröder


A estrondosa derrota do SPD nas últimas eleições para o Parlamento Europeu, provocada pela agressão contra a Jugoslávia e o escândalo da declaração Blair-Schröder, em vez de levarem o Governo de Bona a reflectir sobre as causas do desastre, tornou ainda mais agressiva a sua política de desmontagem social segundo o princípio ‘uma vez perdida a fama avancemos sem vergonha’.

A reforma fiscal do ministro das Finanças, Eichel - que penaliza os rendimentos do trabalho e deixa intocáveis as grandes fortunas e os lucros fabulosos dos bancos e das grandes empresas -, assim como o plano de liquidação do valor das reformas apresentado pelo antigo vice-presidente do sindicato dos metalúrgicos, IG Metal, e hoje ministro do Trabalho, Walter Riester, têm não só acelerado o descrédito da social-democracia junto do eleitorado e da população em geral, mas também originado um clima de revolta nos militantes e na base do SPD.
Diariamente, na rádio, na televisão e nos jornais sucedem-se as declarações de eleitores que afirmam nunca mais voltarem a votar naquele partido. Numerosas organizações de base, particularmente na região do Ruhr e nos Estados do Leste, envergonham-se de participar na campanha eleitoral para as eleições comunais que terão lugar no início de Setembro em vários Estados.
Um grupo de social-democratas de Frankfurt, reunindo várias correntes do partido, acusa Schröder de «fraude eleitoral» e de infringir os acordos da coligação governamental no capítulo «trabalho e justiça social» ao baixar os impostos para o grande capital e ao eliminar meios financeiros destinados aos reformados e desempregados. O chefe do governo do Sarre, Klimmt, sob os aplausos dos delegados no congresso do SPD em Saarbrücken, afirmou, criticando a política do Governo, que «não queremos um capitalismo à inglesa ou como nos Estados Unidos». No mesmo congresso, Ottmar Schrelner, secretário-geral federal do SPD, constatava que «todos os governos que nos anos noventa aplicaram na Europa uma política neoliberal têm sido sistematicamente afastados pelos eleitores».
Mas foi a entrevista dada à «Stern» pelo líder do grupo parlamentar dos social-democratas no Bundestag, Peter Struck, louvando a «terceira via» e declarando que «a posição tradicional de um partido dos trabalhadores de tirar aos ricos para dar aos pobres já não correspondia a uma sociedade moderna», que chocou totalmente milhares de militantes e numerosas organizações do partido. Tanto mais que aquela afirmação pretendia esconder a verdadeira natureza das medidas fiscais do Governo, que consiste, segundo Dieter Schulte, presidente da DGB, em «tirar aos trabalhadores para dar ao patronato». Aliás, Olav Henkel, chefe da poderosa Federação da Indústria, confirmou na ARD o seu apoio à declaração Blair-Schröder, louvou as medidas anunciadas pelo Governo, e foi mesmo ao ponto de ameaçar a própria democracia-cristã para não tentar opor-se ao Governo, fazendo frente com os sindicatos e «ultrapassando a social-democracia pela esquerda».
Um dos maiores segredos dos regimes capitalistas no final do século vinte consistirá em saber a razão pela qual o patronato e os multimilionários, representando uma faixa minúscula do eleitorado, conseguem controlar tantos partidos, enquanto os milhões de cidadãos eleitores que vivem do seu trabalho ficam, depois das eleições, quase sempre a ver navios. Mas o capital não manda só nos partidos. Ainda recente o general do «novo centro», Kirchbach, inspector-geral da Bundeswehr, inspirado pelo sucesso do regresso das tropas alemãs aos Balcãs, apresentava planos para a intervenção do exército no interior do país, justificando-a pelo «aumento das tensões económicas, étnicas e religiosas» na Alemanha. Provavelmente levado pelos mesmos motivos, um outro «modernista», o ministro da Defesa, Sharping, candidato preferido dos Estados Unidos para o cargo recentemente ocupado por um ministro de Blair, de novo secretário-geral da NATO, decidiu realizar os juramentos de bandeira fora dos quartéis, na praça pública, retomando assim uma tradição que desde o fim do III Reiche hitleriano havia sido banida dos rituais germânicos.

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Novos muros

O chanceler Schröder deu início às suas actividades a partir da nova sede do Governo, em Berlim num ambiente pouco saudável.
Por absurdo que pareça, pelo mesmo trabalho, os funcionários da administração federal que tinham a sua sede na parte ocidental de Berlim (a maioria) recebem um salário superior aos seus colegas de Leste. Estes auferem um rendimento 13,5 por cento inferior e trabalham mais uma hora.
A dificuldade não está em encontrar uma saída para a equiparação dos cerca de mil funcionários afectados pela discriminação. O problema de fundo, que Schröder não quer encarar, é que isso criaria um precedente para as administrações regionais e para os funcionários federais que trabalham nos länder, o que obrigaria a igualar os salários de um milhão de pessoas, sem contar com as incidências de tal medida no sector privado. Afinal, os novos «muros» dão muito jeito.


«Avante!» Nº 1343 - 26.Agosto.1999