Jugoslávia
Oposição não capitaliza
descontentamento sérvio


Cento e cinquenta mil pessoas manifestaram-se há uma semana em Belgrado em frente ao Parlamento Federal, exprimindo o seu protesto contra a situação que se vive no país. Convocada por diversos partidos da oposição, vaiados à vez durante as intervenções, a manifestação tornou evidente que o descontentamento real da população está longe de ter sido capitalizado por partidos que se degladiam na luta pelo poder.

Um comentador da televisão pública de Belgrado sintetizou de forma lapidar o sentimento generalizado depois da manifestação de protesto: «Não se sabe quem ficou mais decepcionado, se os organizadores, se a NATO ou se os participantes».
A divisão reinante nas hostes da oposição ficou patente nos discursos de Zoran Djindjic e Vuc Draskovic. O primeiro deu ao Governo um prazo de 15 dias parar abandonar o poder; o segundo pediu eleições antecipadas para Novembro, o que segundo a agência Beta já havia sido admitido na véspera pelo próprio presidente Milosevic.
Aparentemente, nenhum dos partidos da oposição parece ainda ter entendido que a revolta dos sérvios contra o Governo radica no que todos os que têm os olhos postos no ocidente preferem ignorar: a questão do Kosovo e as consequências devastadoras das agressões da NATO.
«Nunca te perdoaremos o Kosovo» é uma das mensagens mais comuns a Milosevic, acusado de ter capitulado perante a NATO. E por todo o lado se ouvem críticas aos «esfomeados de poder» - os dirigentes da oposição -, que segundo reconheceu Jozsef Kasza, responsável da Aliança dos Húngaros de Voivodine, aos microfones da rádio independente B2-92, não dão qualquer sinal de se poderem unir ou de ser capazes «de realizar em conjunto as mudanças necessárias à Sérvia». Uma acusação a que não escapa o próprio Kasza, que optou por não intervir na manifestação, incapaz de explicar que benefícios adviriam para o país se se concretizasse a exigência, feita no mesmo dia por cerca de 10.000 pessoas na vizinha Hungria, de anexação da Voivodina (onde vivem 350.000 húngaros) à Hungria. A manifestação foi organizada pelo Partido da Verdade e Vida Húngara, de extrema-direita.
Os dirigentes da oposição também não apresentam soluções para a dramática situação em que ficou a Jugoslávia após 11 semanas de guerra: segundo dados da Economist Intelligence Unit (EIU), os prejuízos ascendem a 60 mil milhões de dólares. Este ano, o PIB será 30 por cento mais baixo do que em 1989.
A guerra fez da Jugoslávia o país mais pobre da Europa, em rendimento «per capita», mas os que aspiram à cadeira de Milosevic não apresentam uma única proposta para fazer face à situação.


Militares tomam posição

Entretanto, a oposição parece apostada em arrastar os militares para a luta política. É pelo menos essa a opinião de cinco generais, que em carta aberta publicada ontem pelo diário «Blic», citada pela Lusa, afirmam que «alguns membros da oposição não estão convencidos de poderem ganhar as eleições, pelo que convidam o exército a ajudá-los a derrubar o poder legalmente eleito».
«O exército jugoslavo não vai permitir uma guerra civil fratricida e, enquanto instituição apolítica, não participará em acontecimentos políticos», escrevem os generais Ljubisa Stojimirovic, Vladimir Lazarevic, Negoslav Nikolic, Tomislav Maldenovic e Milan Djakovic., garantindo que o exército «respeitará escrupulosamente a vontade política expressa pelos cidadãos da Jugoslávia nas eleições».
Os subscritores da carta acusam ainda o antigo chefe do Estado Maior, Momcilo Perisic, que recentemente entrou na cena política como líder do recém-formado Movimento para uma Sérvia Democrática (PDS), de ter «falhado na missão que lhe foi confiada no Kosovo pelo Conselho supremo de defesa». Os cinco generais afirmam que, durante os ataques da NATO, o general Perisic manteve um contacto permanente com o chefe supremo das forças aliadas, o general norte-americano Wesley Clark, «que lhe dizia o que devia fazer».


«Avante!» Nº 1343 - 26.Agosto.1999