Carlos Carvalhas no comício do Porto
Somos o Partido das grandes causas sociais


«Pela sua natureza e ideologia, o PCP soube estar na primeira linha da defesa dos interesses e direitos da classe operária e dos trabalhadores, das justas reivindicações das camadas médias», disse Carlos Carvalhas, no comício comemorativo do 78º aniversário do PCP, no sábado passado, realizado no Porto, numa intervenção cujos extractos mais significativos a seguir se transcrevem.

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À beira de duas importantes eleições, quando olhamos as encenações que estão em marcha e quando vemos o nevoeiro político que o PS e AD estão a soprar, dá vontade de exigir ao menos um pouco de verdade e um pouco de respeito pelos cidadãos.
De facto, quando vemos o PS e a AD a quererem apresentar-se como grandes adversários ou inimigos e quando ouvimos todos os dias a gritaria e o espalhafato do seu ping-pong verbal, só nos apetece dizer que é pena, é muita pena que toda esta pretensa animosidade, todo este aparente antagonismo e todas estas supostas divergências não tenham vindo ao de cima uns segundos antes de o PS e a direita, umas vezes com o PSD, outras com o PP e outras com os dois, terem votado juntos todos os Orçamentos de Estado, terem aprovado a revisão constitucional, terem aprovado os mais importantes instrumentos que facilitaram a vida às grandes opções da política de direita.
De facto, quando vemos Marcelo Rebelo de Sousa a chorar, dia sim dia não, lágrimas de crocodilo pelos problemas sociais e pelos dramas dos mais pobres, dos humilhados e ofendidos, quando vemos Marcelo Rebelo de Sousa a falar como se fosse um autêntico justiceiro antimonopolista e um irreconciliável inimigo do poder do grande capital, só nos apetece perguntar onde é que ele estava quando, com o PS, o PSD chumbou a proposta do PCP para que a idade da reforma das mulheres voltasse para os 62 anos; quando, com o PS, o PSD chumbou a primeira proposta do PCP para consagrar as 40 horas de trabalho semanal; quando o PSD deu todo o apoio e bateu palmas à furiosa e brutal política de privatizações do Governo do PS que vai ficar para a história como um dos mais implacáveis assaltos ao património público.
De facto, quando vemos António Guterres, o PS e os outros partidos socialistas europeus a congeminarem em Milão, um 37º Plano de combate ao desemprego, a dizerem que é preciso «uma nova via» para a construção europeia e a prometerem que agora é que isto vai porque os socialistas governam a maioria dos países da União Europeia, só nos apetece lembrar que há cinco anos, nas anteriores eleições para o Parlamento Europeu, os socialistas europeu até afixaram aqui em Portugal uma cartaz onde uma jovem dizia que «a minha Europa é a que combate o desemprego», lembrar que já antes os socialistas estavam em 9 governos da UE e, por isso, só nos apetece perguntar o que é que andaram a fazer nestes últimos cinco anos.
De facto, quando vemos o Dr. Mário Soares, a par do seu impenitente federalismo, a marcar distâncias em relação ao neoliberalismo, e quando vemos a Dr.ª Leonor Beleza a clamar que a Europa tem de prestar mais atenção aos desprotegidos, só nos apetece perguntar onde é que eles estavam em todos estes longos anos em que PS e PSD andaram a ser sócios e cúmplices de todos passos e linhas orientadoras desta «construção europeia» que estão precisamente na origem dos problemas e consequências de que os cabeças de lista do PS e do PSD se queixam agora, para eleitor ver.

Um novo rumo
para a construção europeia

Afirmam os historiadores que foi em 732 que os termos "Europa" e "europeu" surgiram pela primeira vez pela pena de um Espanhol: «saindo das suas casas, escrevia ele, os europeus viam as tendas bem arrumadas dos Árabes».
Era uma Europa com exclusão dos outros, uma Europa contra os outros.
De facto a história mostra-nos que a Europa se pode definir «contra o outro». E esta concepção que é a concepção da Europa agressiva, de espírito de cruzada, do colonialismo e do neocolonialismo, é a Europa xenófoba, a Europa do anti-semitismo e do holocausto, que continua a ter os seus seguidores.

Mas há também a Europa dos povos, do movimento popular e dos sindicatos, a Europa das luzes, a Europa da Revolução Francesa e da Revolução de Outubro, que recusa a concepção de Europa fortaleza. A Europa aberta ao mundo, a Europa aberta ao terceiro mundo, aberta aos homens e às culturas do Sul. É nesta concepção que nos situamos.
Recusamos as concepções eurocêntricas, assim como recusamos as concepções xenófobas e racistas ou as concepções federalistas.
Aqueles que defendem uma União Europeia federalista, estão no fundo a defender a dissolução do nosso país numa região sem rosto, comandada por um directório de grandes potências.
Quando se diz por exemplo, que a Europa deve falar a uma só voz, tem que se perguntar qual voz? Só ingenuamente é que se poderá pensar que essa voz não seria no essencial a voz das grandes potências.
Como aliás já se viu por exemplo em 1991 quando a Alemanha reconheceu unilateralmente a Croácia e a Eslovénia!
Dizem-nos que o federalismo se impõe para permitir à Europa no plano económico fazer face aos EUA e ao Japão.
Mas a verdade é que todos os dias vemos acordos, fusões e absorções entre grandes grupos económicos dos três espaços económicos.
Como já alguém disse quando por exemplo, na indústria electrónica – e sabemos da sua importância no presente e no futuro – a Toshiba, a IBM e a Siemens se associam estamos perante o fim das ilusões de uma política electrónica europeia.
Ou quando a British Airways ficou com o controlo da U.S. AIR e passa ao top mundial das companhias aéreas, deu-se o toque de finados sobre uma política concertada do transporte aéreo mundial...
Também as concepções de uma Europa bloco político-militar, e as concepções que absolutizam o mercado e a concorrência numa lógica de guerra não auguram nada de positivo.
Nós continuamos a lutar com outras forças comunistas e progressistas por:

- Uma União Europeia, que realize o princípio da "coesão económica e social" e o pleno emprego e não a "União Europeia" dos milhões de pobres e desempregados.
- Uma União Europeia, com uma grande dimensão social e ambiental, respeitadora dos interesses tanto dos pequenos como dos grandes países.
- Uma União Europeia mais democrática com as decisões mais próximas dos cidadãos.

Não deixa de ser curioso que muitos dos que ontem nos criticavam e afirmavam que éramos alarmistas, são hoje os primeiros a dizer que a Agenda 2000 tal como foi proposta prejudica enormemente o nosso país, que o Pacto de Estabilidade tem que ser flexibilizado, que a reforma da PAC não tem em conta a especificidade da agricultura portuguesa e que mais importante que a convergência nominal é a convergência real das economias.
Ora a verdade é que a "política agrícola comum" e a última reforma da PAC aceite pelo PSD prejudicam gravemente a agricultura portuguesa.
Ao contrário das agriculturas dos países do Norte nós não temos excesso de produção. O compromisso da presidência alemã não dá resposta a problemas essenciais da nossa agricultura.
Num país com uma produção tão insuficiente é uma afronta ver pagar-se para abater barcos de pesca; pagar-se para se ter campos abandonados; enterrar fruta que falta em casa de tantas famílias.
Por isso, nós exigimos firmeza nas negociações em curso. Pela nossa parte tudo faremos para potenciar o "poder negocial de Portugal".
Ao longo destes três anos aumentou o domínio do capital estrangeiro sobre a economia nacional. Há uma crescente subcontratação da economia portuguesa e uma crescente substituição da produção nacional pela produção estrangeira. O défice da balança comercial é inquietante.
Importantes unidades produtivas são encerradas e transferidas para Espanha e as empresas nacionais transformadas em entrepostos ou armazéns!
A par do crescimento das actividades especulativas e parasitárias e da concentração da riqueza, cresce o trabalho precário e o número de excluídos.

Precisamos de uma outra política e de um outro rumo na construção europeia.

A defesa dos interesses nacionais e de um novo rumo para a construção europeia exige empenho, luta e também convergência da acção com outras forças comunistas, progressistas e ecologistas. Também por isso, valorizamos o "Apelo Comum", assinado por vários partidos progressistas e comunistas europeus, dirigido aos povos da Europa para que nestas eleições europeias reforcem aqueles que lhes dão voz.
A nossa lista para o Parlamento Europeu é composta por homens e mulheres com provas dadas, tem como cabeça de lista a camarada Ilda Figueiredo e terá uma significativa percentagem de mulheres.
Damos assim um forte sinal do que nos tínhamos comprometido. Também contamos na lista, como sabem, com o camarada José Saramago e com destacados cidadãos da cultura, do movimento sindical e do mundo do trabalho.
Com a forte presença feminina queremos também expressar o valor que damos à participação da mulher em igualdade.(...)


Pelo aprofundamento da democracia,
pela justiça social

Este Partido com uma história de 78 anos, Partido de resistência e de luta, Partido de construção e proposta, pode afirmar hoje, no limiar de um novo século, em novas condições e perante novas realidades, que continua e queremos que continue a ser o Partido das grandes causas sociais, com um ideal e um projecto de transformação e emancipação humana.
Mas também um Partido sempre empenhado com a defesa do regime democrático, sempre empenhado no aprofundamento da democracia.
E há questões que não podem deixar de nos preocupar porque atingem a vida democrática e as instituições.
É por exemplo o caso da JAE onde continuam a ralhar as comadres mas onde as verdades pouco aparecem. Ora as acusações de corrupção e do favorecimento dos partidos que têm estado no poder bem como as fugas aos inquéritos feitos pelo governo não podem deixar de escandalizar a opinião pública.
No mesmo sentido estão as questões da insegurança na sociedade, que não está desligada da acentuação das desigualdades ou também as questões da morosidade da justiça, nomeadamente em relação aos chamados crimes de colarinho branco.
Também em relação ao Serviço de Informações Estratégicas de Defesa e Militares, as recentes notícias não podem deixar de suscitar grandes interrogações na opinião pública. A imprensa afirma que o ex-director desse serviço, em carta dirigida ao Eng. Guterres acusa o ministro da Defesa de o "ter instruído para espiar as chefias militares" e o Primeiro-Ministro perante a gravidade destas notícias remete-se pura e simplesmente ao silêncio...
A democracia exige transparência e verdade. O povo português, a Assembleia da República e a Instituição militar têm o direito de conhecer toda a verdade.
E se os factos são como a imprensa relata o Primeiro-Ministro não pode deixar de tirar as conclusões que se impõem, isto é, sobre o perfil que o Portugal de Abril exige para um ministro da Defesa.
Não há silêncios, nem passes de mágica que consigam disfarçar o indisfarçável.

O que é certo, é que o ex-Director Geral escreveu uma carta ao Primeiro-Ministro, onde, tudo indica, se refere a estas e outras situações, que o puseram em choque com o ministro da Defesa. Essa carta não é nenhum segredo que o Governo possa esconder ao País. O PCP já fez um requerimento ao Governo e na Assembleia estão a ser feitas audições sobre o assunto.
Daqui fazemos o desafio ao Primeiro-Ministro, para que dê uma explicação completa ao país sobre este caso de desvio de funções dos Serviços de Informações, que mostre as denúncias que contenha a carta do ex-Director Geral e que, como Primeiro-Ministro do Governo PS, tire as ilações práticas que se impõem em relação ao ministro da Defesa.
Pela sua natureza e ideologia, o PCP soube estar na primeira linha da defesa dos interesses e direitos da classe operária e dos trabalhadores, das justas reivindicações das camadas médias. Nunca regateou esforços e energias na luta e nas causas dos agricultores, dos estudantes, das mulheres, dos reformados e mais desfavorecidos, dos pequenos e médios empresários, dos criadores culturais, da intelectualidade, intervindo a todos os níveis da sociedade.
É a vida que faz prova da afirmação. Quisemos e soubemos afirmar o nosso Partido, dando ânimo, solidariedade e confiança aos trabalhadores e ao movimento sindical em momentos decisivos, para travar e adiar o pacote laboral do Governo.
Protagonizado por homens e mulheres concretos que incorporam o nosso grande colectivo partidário, estivemos à frente da luta contra os despedimentos, na luta contra as privatizações e a retirada de direitos, fosse na EDP, nas comunicações, nas cimenteiras ou no sector dos transportes ferroviários, aéreos, nos portuários, na luta por melhores salários e melhores direitos, fosse na Petrogal, em que houve uma greve com elevadíssima expressão e vitoriosa, ou na Auto-Europa, na Administração Central ou Local, na metalurgia e química, em empresas de limpeza, na construção civil, na têxtil, nas indústrias eléctricas ou nos estabelecimentos fabris das Forças Armadas. Mas também marcámos presença e proposta nas lutas mais justas dos agricultores, dos pescadores, nas reivindicações do comércio tradicional e do movimento das micro, pequenas e médias empresas, no protesto público e na reivindicação estudantil, na manifestação dos reformados, na denúncia e na iniciativa das mulheres pela igualdade e contra as discriminações, na divulgação das inquietações e das propostas de pequenos e médios comerciantes e industriais.

Há uma semana desafiámos o Governo a cumprir com a 2ª fase do aumento extraordinário dos reformados e de uma forma mais generalizada já no mês de Abril.
Até agora o Governo e nomeadamente o Primeiro-Ministro manteve-se em silêncio à espera que o tema e o desafio entrem no esquecimento.
Não terá de nós esse contributo.

Insistimos no desafio ao Governo e ao Primeiro-Ministro.
O Governo sabe que há meios suficientes para aumentar já no próximo mês de Abril os reformados pensionistas e idosos. Não precisa de esperar para Junho ou Julho para o fazer.
Certamente que estais de acordo com esta nossa exigência. O 25 de Abril e os reformados merecem-no.
O Governo não pode fechar os olhos ao facto de 1,8 milhões de reformados terem pensões inferiores a 32 mil escudos e de 32% das famílias portuguesas viverem abaixo do nível de subsistência sendo os reformados pensionistas e idosos os mais atingidos.
Aliás o alargamento do nosso mercado interno pelo aumento de poder de compra das camadas populares é um factor de justiça social e de eficácia económica. Foi também nesse sentido que exigimos a diminuição das tarifas eléctricas e das tarifas dos telefones, nomeadamente com a eliminação da taxa de activação.
Também não se compreendem as razões porque o Governo continua a manter os preços dos combustíveis que são 20% mais caros do que em Espanha, quando o preço do petróleo tem baixado acentuadamente.
Ora é sabido que, por cada litro de gasolina o Estado arrecada quase 80% em impostos.

O Governo pode estar também aqui a pensar em deixar passar mais uns meses angariando mais umas receitas e deixar a baixa para mais perto dos actos eleitorais. Seria um cálculo oportunista e eleitoralista que colocaria os interesses partidários acima dos interesses dos cidadãos.
E se o Governo quer fazer algumas poupanças deve começar por dar o exemplo e não dar tristes espectáculos exibicionistas, como o de vários membros do Governo se terem deslocado em vários helicópteros à Feira do Fumeiro, em Vinhais, como as derrapagens orçamentais na EXPO, na Saúde, na rede do gás, etc., etc. ...
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A necessidade e importância
do reforço da CDU

Desenganem-se os que ontem diziam as coisas mais cruéis e radicais sobre as semelhanças entre PS e PSD e agora meteram a viola no saco e só sabem pôr a tocar a cassete do pretenso «declínio» do PCP.
Desenganem-se os que nos querem afundar no pessimismo das suas sondagens, das suas profecias arrogantes e do seu preconceito empedernido.
E saibam todos que o PCP e a CDU vão para estas eleições com determinação, audácia e confiança, vão para estas eleições para nelas investir a sua capacidade de indignação com o que está mal e nelas investir as suas propostas para a uma política de esquerda, vão para estas eleições para falar dos problemas vivos do povo e do país, vão para estas eleições para crescer e avançar.
Por isso é da máxima importância que mais portugueses compreendam que se estão a prejudicar a si próprios de cada vez que separam as eleições do que acontece e do que pensavam no intervalo entre eleições e de cada vez que voltam a votar naqueles mesmos de cuja política tão amargamente se queixavam em anos anteriores.
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É da máxima importância que desta vez haja mais portugueses que compreendam que o dito "voto útil" no PS por medo do regresso da direita não passa de um grande logro que sem dúvida é muito útil para o PS que recebe os votos mas que não é nada útil para quem lhos dá; que haja mais portugueses que sejam capazes de compreender que, se nas eleições de 95, em que o PS teve 43% dos votos, o PSD 34% e a CDU 8,5%, se, por exemplo, o PS tivesse tido 38% e a CDU 13%, a direita teria sido na mesma afastada do poder mas, nesta legislatura, o PCP teria pesado muito mais e influenciado muito mais para uma política melhor para Portugal e para os portugueses; que haja mais portugueses que desta vez compreendam melhor que falamos inteiramente verdade quando afirmamos que, para quem não quer a direita no Governo e para quem quer uma política realmente de esquerda, não há voto mais útil, mais eficaz e mais seguro que o voto na CDU.
É da máxima importância que desta vez haja mais portugueses que compreendam que toda essa conversa sobre "os partidos serem todos iguais" e "todos quererem um tacho" pode ser uma boa desculpa para quem não quer mudar nada e sobretudo não está ainda disponível a mudar de voto, mas é sobretudo uma generalização sem fundamento que acaba por beneficiar e absolver os que têm culpa. Temos esperança de que haja mais portugueses que, dispondo-se a fazer a comparação verdadeira entre o que nós somos, o que nós fazemos, o que nós servimos, o que nós propomos, as causas que nós defendemos e o que a direita e o PS são, fazem, propõem e a quem servem, concluam acertadamente que, de facto, somos a esquerda que faz a diferença e também somos a diferença que faz a esquerda.
Temos a esperança – e sobretudo trabalharemos para isso – que desta vez haja mais portugueses que compreendam que, num quadro em que a "AD" por mais que, hipocritamente, se diga convertida aos grandes problemas sociais e aos dramas dos pobres, humilhados e ofendidos, não tem hipótese de vitória e num quadro em que o PS claramente anuncia que quer continuar com a mesma política, então só o reforço do PCP e da CDU é que poderá ser o grande sinal e o mais forte impulso saído dos resultados eleitorais, para ajudar a uma viragem à esquerda na política e no Governo do país.
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«Avante!» Nº 1320 - 18.Março.1999