CANÁ
O massacre


Nem sempre aquilo que ouvimos e ou lemos nos dá a dimensão de que vemos. Na recente viagem ao Líbano, para participar no 8º Congresso do Partido Comunista Libanês, pude confirmar que uma coisa é ler e até ver imagens do massacre perpetrado pelo exército israelita no sul do Líbano, em Caná, e outra é ver com os próprios olhos o local, as circunstâncias, o envolvimento e viver todo esse ambiente e sentir como a ordem mundial é chocante, injusta e brutal.

Contrariando o direito internacional e violando a resolução 425 do Conselho de Segurança que exige a retirada das tropas israelitas que ocupam o sul do Líbano desde 1978, Israel serve-se dessa ocupação para ameaçar e intimidar as populações libanesas, de maioria muçulmana chiita. São, por isso, milhares os refugiados em toda a área. Em Abril de 1996 tropas de Israel entraram em Caná e anunciaram que iriam bombardear a zona por alegadamente dar protecção à resistência armada contra os ocupantes.
Crianças e velhos procuraram refúgio num posto da ONU e ali permaneceram até dia 18 de Abril. Tratava-se de um barracão de madeira encostado ao posto da ONU , no qual comiam e repousavam os refugiados.
Cerca das 14 horas do dia 18.05.96 helicópteros e tanques israelitas durante seis minutos fizeram desaparecer o abrigo e assassinaram cento e dez pessoas com idades compreendidas entre os nove e os setenta e cinco anos. As vítimas preparavam-se para comer quando as fizeram em pedaços .

Sei que houve quem relatasse o acontecimento, mas a verdade, é que este frio e brutal massacre não tocou no "dorido" coração dos poderosos do mundo. E não cabe dúvidas que Israel viola resoluções do Conselho de Segurança, espezinha o direito internacional, massacra populações. Más é um aliados dos EUA e dos países europeus. E os crimes cometidos pelos amigos são para serem silenciados, para não se fazer caso.
Em Caná, nos confins do sul do Líbano, as populações libanesas são espezinhadas pelas tropas israelitas. A " nova" ordem está preocupada com a Jugoslávia e com o Iraque. No sul do Líbano, no Médio Oriente essa ordem é assegurada pelo poderoso exército israelita, fora das fronteiras de Israel. O silêncio cúmplice serve para premiar os executantes da aplicação da "nova" ordem. Porém , por mais massacres que levem a cabo, os povos não se vão render, como não se rendem pelo que vimos no sul do Líbano.

No sul do Líbano pudemos ver a determinação dos comunistas e de outras forças em prosseguir a resistência armada aos ocupantes e a luta por um Líbano árabe, não confessional e democrático.
Na milenar história do Líbano escrevem-se hoje páginas de sofrimento e dor, mas são essas que vão conduzir ao Líbano dos libaneses, ao Líbano democrático e pleno de progresso social. — Domingos Lopes


«Avante!» Nº 1315 - 11.Fevereiro.1999