Encontro distrital de Setúbal da JCP
Um luta por ideais com futuro


No ano em que comemora o 20.º aniversário, a JCP tem marcado para os próximos dias 27 e 28 de Março, em Almada, o seu 6.º Congresso, que decorrerá sob o lema «JCP em luta pelo futuro» e que constituirá um importante momento de afirmação da organização de jovens comunistas.
No âmbito da preparação da reunião magna da JCP, realizou-se no passado sábado, nos «Penicheiros» do Barreiro, o 6º Encontro Distrital de Setúbal, em cujos trabalhos participaram Carlos Carvalhas, secretário-geral do PCP e Luísa Araújo, membro da Comissão Política do PCP.

Após uma breve sessão de abertura, os mais de cem jovens presentes dividiram-se em três painéis sectoriais sobre o ensino secundário, superior e juventude trabalhadora, onde depois de animados debates foram aprovadas as principais linhas de intervenção para o reforço das organizações e definidas as grandes frentes de mobilização e de luta dos jovens.
No secundário, o Encontro assinalou a crescente afirmação da JCP, das suas propostas e ideias, que se traduziu na ampliação dos colectivos de escola e na constituição de grupos de intervenção e de listas unitárias para as associações de estudantes.
A falta de condições nas escolas secundárias, resultante da degradação das instalações, das sobrelotação e da insuficiência de meios materiais e humanos, é uma das principais preocupações manifestadas no Encontro que apontou ainda vários outros motivos de contestação.
Designadamente, a existência do numerus clausus no acesso ao ensino superior; as provas globais e os exames nacionais, que contrariam o sistema de avaliação contínua; o regime disciplinar, considerado desajustado da realidade; o diploma de gestão e autonomia das escolas, que segue a lógica empresarial e mercantilista da educação; os currículos escolares demasiado extensos e desajustados; o desinteresse do Estado pelo ensino nocturno; o não cumprimento da lei sobre a educação sexual.

Um superior menos elitista

O painel sobre o ensino superior colocou a tónica na qualidade de ensino, na acção social escolar, nas prescrições e nas propinas. Segundo a resolução aprovada, o Governo PS continua a política neo-liberal do PSD, «apostando na progressiva elitização e privatização do ensino superior e empurrando milhares de jovens para o ensino privado».
Num cenário de salas sobrelotadas, refeitórios e bibliotecas sem condições, falta de laboratórios e locais de estudo, os jovens comunistas sublinham que «não podemos pactuar com uma lei que obriga os bolseiros a pagar uma taxa como é a propina», acrescentando que a lei de financiamento não resolve a falta de residências estudantis, não permite aumentar o valor das bolsas nem as estende à maioria dos estudantes com dificuldades.
Outro aspecto criticado nesta lei é o facto de prever prescrições, sem atender às diferentes causas que levam muitos estudantes a deixar cadeiras para trás.
A propina é deste modo considerada como mais uma barreira difícil de transpor, em especial aos estudantes deslocados, que têm já de fazer um grande esforço financeiros com livros e fotocópias, alimentação, transportes, alojamento, entre outros encargos.
Reconhecendo dificuldades da organização no ensino Superior de Setúbal, o Encontro salientou, entretanto, que têm sido dados passos positivos, designadamente, a participação de comunistas em listas unitárias a formação do colectivo da Faculdade de Ciências e Tecnologia, e a crescente dinâmica de luta em torno dos problemas dos estudantes.

Geração sem direitos

O debate sobre a juventude trabalhadora centrou-se nas dificuldades de ingresso no mundo do trabalho e na situação particular do distrito de Setúbal, onde a taxa desemprego ultrapassa a média nacional, performance que a instalação de grandes empresas ou das grandes superfícies comerciais não conseguiu alterar.
Pelo contrário, salienta-se no documento aprovado, o progressivo encerramento de empresas e a precarização das relações laborais nas novas unidades «não ajudam a combater o desemprego nem a criar uma vida estável e com perspectivas de futuro» aos jovens trabalhadores.
Os exemplos de retirada de direitos são abundantes: baixos salários, incumprimento do horário de trabalho, não pagamento de horas extraordinárias, discriminação sexual das jovens que são obrigadas a assinarem declarações em como não pretendem engravidar para obterem emprego, e a extrema precariedade dos vínculos, são alguns dos traços gerais da realizada laboral do distrito.
Como se não bastasse, sobre os jovens trabalhadores paira agora a ameaça de novos retrocessos caso o pacote laboral que o Governo pretende impor venha a ser aprovado.
Entre as orientações para a intervenção da JCP, o Encontro apontou a necessidade de dirigir o recrutamento para os locais de trabalho; de aumentar a participação de militantes na vida das empresa e no movimento sindical; de integrar jovens trabalhadores no trabalho geral da JCP; e de constituir uma Comissão de jovens trabalhadores a nível do distrito.

Organização reforçada

Depois de breve balanço do trabalho realizado nos últimos dois anos, em que se dá nota das dificuldades e avanços da organização, o Encontro aprovou uma série tarefas prioritárias dos jovens comunistas, onde se destacam a participação nas batalhas eleitorais, nas comemorações dos 25 anos do 25 de Abril e do 1º de Maio, o 20.º aniversário da JCP e a preparação do seu 6º Congresso.
Neste sentido, os jovens comunistas de Setúbal decidiram promover iniciativas de desporto, convívio e debate, participar nos concursos nacionais de murais e de literatura, contribuir para as campanhas de fundos e de recrutamento, propondo-se recolher mil contos e recrutar mil novos militantes. Prioridades de trabalho são ainda a discussão dos documento do congresso - «Uma política de esquerda para a juventude portuguesa» e JCP - Organização revolucionária para a juventude» - e a eleição de delegados.

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Extractos da intervenção de Carlos Carvalhas:
Aspirações juvenis
exigem respostas concretas

«(...) Creio que a juventude e o povo português estão mais preocupados com o emprego e as ameaças de despedimentos, com o insucesso escolar, com a falta de perspectivas para tantos jovens, com as listas de espera nos serviços públicos de saúde, com a falta habitação nos meios urbanos, com a insegurança, a exclusão social e a proliferação da droga.
O que preocupa os reformados, são as baixas reformas, o preço dos medicamentos, a falta de cuidados de saúde e de Centros de Dia.
O que preocupa os trabalhadores não são as ambições de poder absoluto de tal ou tal partido, mas os baixos salários, as alterações à legislação laboral, a insegurança quanto ao futuro.
E estas questões é que nos devem preocupar. Creio que estais de acordo que Portugal precisa de entrar no século XXI não com uma distribuição do Rendimento Nacional profundamente desequilibrada, com uma brutal concentração da riqueza, mas sim, com uma redução significativa das desigualdades sociais e com uma reforma fiscal que introduza mais verdade, mais transparência, mais justiça social.
»

«(...) Portugal precisa de entrar no século XXI não com os cidadãos desencantados, desinteressados da sua participação cívica e política, ou com uma Justiça morosa e iníqua, com a insegurança nas ruas e os fenómenos do racismo e da xenofobia, mas sim com passos decisivos no aprofundamento da demagogia política, social e cultural, com uma Justiça célere, igual tanto para os grandes como para os pequenos, com tranquilidade e convivência nas ruas e a estabilidade nas periferias urbanas.
Portugal precisa de entrar no século XXI não com discursos de retórica sobre o social, como ainda hoje ouvimos num determinado Congresso, como se estivéssemos num país virtual, mas sim com o cumprimento do que se promete, com as palavras a corresponderem aos actos, com propostas, medidas e políticas concretas, que apontem soluções para um ensino melhor, para saídas profissionais e que rasguem os caminhos do futuro, que dêem resposta aos problemas e que vão ao encontro das aspirações juvenis.
Portugal precisa de entrar no século XXI, não com uma boa parte da juventude desempregada, ou com um emprego precário e mal pago, ou na sangria da emigração, mas com uma juventude crescentemente instruída, profissionalmente apta, com empregos com direitos e salários dignos, com o seu trabalho valorizado e socialmente reconhecido.
Portugal precisa de entrar no século XXI, não com um interior cada vez mais envelhecido e desertificado, com uma agricultura arruinada e um aparelho produtivo cada vez mais dependente e atrasado, mas com a defesa e valorização da sua produção, na agricultura, nas pescas e na indústria, com serviços modernos e qualificados, com o aproveitamento e potenciação dos seus recursos, numa estratégia de desenvolvimento sustentado, com dimensão social e ambiental e correctora dos desequilíbrios regionais.
Portugal precisa de entrar no século XXI, não como uma região sem alma numa Europa neoliberal de exclusão social, desemprego maciço e pobreza crescente, mas sim como um país com voz, contribuindo para o diálogo das culturas, para uma Europa de altos padrões de justiça social, de qualidade de vida, de cooperação. Um Portugal moderno numa Europa de paz e progresso.
Um Portugal que olhe para a sua juventude que é o mesmo que olhar para o seu futuro.(...)
»


«Avante!» Nº 1315 - 11.Fevereiro.1999