68 anos: avante!


No dia 15, o «Avante!» faz 68 anos. Assinalemos, pois, essa importante data, sem imodéstias nem falsas modéstias, ou seja, com a certeza de que cumprimos um acto da mais elementar justiça e com a firme convicção de que estamos a referenciar um caso singular na história da imprensa portuguesa. De facto, comemoramos o aniversário do nosso jornal sublinhando o que a verdade e o rigor mandam sublinhar: a coragem, a determinação, a abnegação, a criatividade de gerações sucessivas de homens e mulheres que, em cada momento desses 68 anos, fizeram do «Avante!» o que era necessário que fosse o Órgão Central do Partido Comunista Português, partido da classe operária e de todos os trabalhadores.
A história do «Avante!» percorre a história do nosso país e do nosso povo e insere-se nela como elemento activo nestas quase sete décadas de existência. Instrumento destacado na resistência e no combate à opressão, voz maior e sempre presente na denúncia das violências e crimes fascistas, construtor de Abril e tribuna dos seus ideais, trincheira de luta pelas conquistas alcançadas pelos trabalhadores e pelo povo, organizador e mobilizador das massas para a defesa dessas conquistas e para a construção de um Portugal melhor - o «Avante!», nestes 68 anos de vida, esteve sempre onde devia estar: ao lado dos explorados e oprimidos, da liberdade e da democracia, da luta por uma sociedade nova, justa, fraterna, solidária, sem exploradores nem explorados.

Sem saudosismos nem ambições de louros ou medalhas, mas porque estes tempos que vivemos de torpes revisões e falsificações da História o exigem, vale a pena avivar memórias e relembrar, ainda que em breve alusão, a vida do «Avante!» nos anos sombrios do regime fascista, hoje beneficiário de um organizado processo de branqueamento que começa na adopção da designação de «antigo regime» e culmina na adulteração do papel dos vários protagonistas, inclusive transformando, não poucas vezes, as vítimas em algozes e vice versa. Nesses tempos de facto de mordaças e algemas, de repressão e violência, o «Avante!» foi sempre, e ininterruptamente, a voz dos que não tinham voz, a opinião livre que o fascismo nunca conseguiu silenciar, o exemplo de coragem que reforçava coragens, a palavra de esperança que alimentava esperanças, o instrumento de luta que estimulava e incitava à luta. Por isso constitui, tal como o PCP e enquanto seu jornal, um dado impossível de ignorar, um ponto de passagem obrigatória e inevitável para quem quer que seja que, sériamente, meta mãos à obra de escrever a história do fascismo e da resistência antifascista em Portugal. Seja qual for o ângulo de abordagem por que se opte, o PCP e o seu «Avante!», pelo papel que desempenharam na luta contra a ditadura fascista, constituem uma referência só contornável por quem escolher o caminho, aliás hoje muito em voga, da mistificação e da falsificação histórica.

Tomemos um exemplo concreto: recentemente foi publicada em Portugal a tradução de um livro intitulado «Salazarismo e Fascismo», da autoria de um historiador francês, de seu nome Yves Léonard. Prefaciado pelo Dr. Mário Soares - que tece os mais rasgados elogios ao autor e à obra - o livro apresenta-se-nos com «apenas uma ambição: a de ser uma síntese tão distanciada e imparcial quanto possível». Nada haveria a dizer da nobre «ambição» se não acontecesse ter o autor conseguido a inaudita proeza de levar o seu «distanciamento» e a sua «imparcialidade» ao ponto de, nas duzentas páginas de texto sobre o tema - «Salazarismo e Fascismo», recorde-se - não referir uma só vez o PCP - nem o «Avante!», obviamente. Por artes só dele conhecidas, o elogiado autor consegue falar das prisões de Caxias, Aljube, Peniche, Tarrafal, Angra do Heroísmo - e ignorar quem as ocupava e nelas sofria as consequências do salazarismo; consegue falar repetidas vezes do «anticomunismo do regime salazarista» e de estruturas e instituições várias criadas com o objectivo específico de «combater o comunismo» - e deixar o leitor na total ignorância sobre o alvo concreto desse «anticomunismo» e desse «combate»; consegue recorrer a uma vasta bibliografia sobre a matéria - e não consultar um único documento produzido pelos protagonistas reais da resistência antifascista (à excepção, naturalmente, do «Portugal Amordaçado» da autoria de Mário Soares, amiúde citado na obra); consegue, enfim, falar da imprensa antifascista (reduzindo-a a duas ou três publicações da área dos «católicos progressistas») - e não fazer uma única referência, uma única alusão ao «Avante!». E é desta seara de joio que o prefaciador, depois de realçar a importância de se «apresentar a verdade dos factos», diz satisfeito: «é isso que este livro faz e muito bem».

Mas voltemos ao trigo: falávamos do 68º aniversário do «Avante!», do seu percurso firme, coerente, transparente, da sua condição de Órgão Central do Partido Comunista Português. Importa assinalar que, por efeito dessa condição, o «Avante!» está indissoluvelmente ligado a toda a restante actividade partidária na medida em que, se por um lado, ele reflecte semanalmente o essencial dessa actividade, por outro lado, é - ele próprio - um interveniente directo, um activista a tempo inteiro na acção, na luta, na intervenção partidária., um elo relevante naquela que é a fonte de força essencial do Partido: a sua ligação às massas. Por tudo isso, o «Avante!» tem como seus primeiros leitores os militantes, amigos e simpatizantes do Partido e coloca como objectivo permanente o aumento da sua difusão e leitura na sociedade em geral, procurando fazer chegar o mais longe possível a voz e a opinião do PCP. Neste tempo em que a comunicação social dominante - cada vez mais transformada em porta voz dos interesses do grande capital que é seu proprietário e, portanto, cada vez mais unanimista na glorificação de facto da política de direita - procura silenciar os problemas e as lutas dos trabalhadores, a difusão e leitura do «Avante!» - único jornal de difusão nacional que assume coerentemente a visão da Esquerda na abordagem da realidade nacional e internacional e das lutas e reivindicações dos trabalhadores - é indispensável para o conhecimento do país real e assume uma importância crescente.


«Avante!» Nº 1315 - 11.Fevereiro.1999