A aritmética da troika

Pedro Lima

Em tempo de mais uma visita da troika a Portugal, não queria deixar de homenagear o esforço heroico destes abençoados tecnocratas. Deixo aqui o meu modesto contributo, como matemático, para uma profunda análise da actividade da troika em Portugal.

Hoje em dia é impossível não se saber o que é a troika. Mas o que poucos em Portugal sabem é que, antes da crise, “troika” era apenas uma palavra russa que significa 3. E foi esse o ponto de partida para a minha teoria :

troika=3

Devo dizer que as primeiras proposições desta teoria nasceram durante uma viagem que fiz à Grécia, em Setembro passado, para participar numa conferência de matemáticos. Ocorreu-me que seria interessante começar a minha intervenção com algo que pudesse interessar a portugueses e a gregos. Ora nada melhor do que a troika para nos aproximar: irmãos na desgraça!

Para começar a estudar a troika, nada melhor do que investigar as suas propriedades locais.

Ora, sendo eu português, mal seria se não me debruçasse sobre as propriedades do 3 (ou seja, da troika) em Portugal. Em primeiro lugar, a PROPRIEDADE SUBTRACTIVA, que se exprime através da seguinte igualdade:

3(PT)=PT-SAL-EDUC-SAÚ-PIB                                                    (1)

(Para quem não conhece ainda as notações, traduzo: troika em Portugal é igual a Portugal menos SALÁRIOS, menos EDUCAÇÃO, menos SAÚDE, menos PRODUTO INTERNO BRUTO).

Mas para não dizerem que eu sou pessimista e só vejo os lados negativos da troika, há que reconhecer também a sua PROPRIEDADE ADITIVA, dada pela seguinte expressão:

3(PT)=PT+DIV+DESEM+IST+PRE+CORR                                  (2)

(Traduzindo de novo: troika em Portugal é igual a Portugal, mais DÍVIDA, mais DESEMPREGO, mais IMPOSTOS SOBRE O TRABALHO, mais altos PREÇOS, mais CORRUPÇÃO.)

Passando das propriedades locais às globais, cumpre esclarecer a seguinte questão: será que a troika (3) se mantém constante? Antes da crise, a resposta era obviamente afirmativa. Mas com a crise tudo mudou, até os conceitos mais básicos. Para responder a esta questão em tempo de crise, vou recorrer a uma técnica bastante comum na Matemática, e que deveria ser mais conhecida dos políticos e economistas da nossa praça: a REDUÇÃO ao ABSURDO. Suponhamos então que a troika (3) se mantém constante. Ora, pelas propriedades subtractiva e aditiva, atrás referidas, de (1) e (2) resulta que, ao manter-se a troika constante, teremos inevitavelmente:

SAL → 0, PIB → 0; SAÚ → 0; EDUC → 0;

Do mesmo modo, teremos:

DIV → ∞ , DESEMP→ ∞ ; IST→ ∞ ; PRE→ ∞; COR→ ∞

(para quem não está familiarizado com as notações matemáticas, digamos simplesmente que os Salários, o PIB, a Saúde e a Educação vão tender para 0, enquanto a Dívida, o Desemprego, a Corrupção, os Preços e os Impostos sobre o Trabalho vão tender para infinito).

Não sendo estes (pelo menos, para a maioria dos portugueses) os resultados desejados, daqui só podemos tirar uma conclusão: AI DE NÓS SE a troika SE MANTIVESSE CONSTANTE!

Por último, recordando que a troika é hoje em dia um problema comum a muitos povos, permito-me concluir esta análise com a seguinte fórmula matemática:

m.d.c. (PT, GR, ESP) = 3 (*)

que se lê assim: o máximo desastre comum entre Portugal, a Grécia e a Espanha é a troika!

 

(*) antigamente, o símbolo m.d.c. lia-se máximo divisor comum mas, como já referi, com a crise tudo mudou!



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