Movimento, oportunismo e acção

Jorge Messias

O la­bi­rinto de becos e vi­elas em que os ca­pi­ta­listas ato­laram a hu­ma­ni­dade só pode ser cor­ri­gido com a re­sis­tência frontal que ex­clui ra­di­cal­mente a in­jus­tiça e o opor­tu­nismo. É a co­ragem po­pular que en­frenta a força bruta dos po­de­rosos e as di­ta­duras dos mo­no­po­listas. Por ou­tras pa­la­vras: na «so­ci­e­dade de con­sumo» – que ful­mi­nan­te­mente se trans­forma em «so­ci­e­dade po­li­cial e con­cen­tra­ci­o­nária» – apagam-se va­lores mo­rais que o mar­xismo ja­mais des­prezou, como a dig­ni­dade da pessoa hu­mana e o di­reito à li­ber­dade. Su­cedem-se por toda a parte os roubos, as trai­ções, as men­tiras e as pro­messas vãs. A su­pe­ri­o­ri­dade moral dos co­mu­nistas, au­sentes dos es­cân­dalos pú­blicos onde im­pera à solta o grande ca­pital, prova uma vez mais que a afir­mação dos grandes va­lores éticos fi­gura na pri­meira linha das trin­cheiras da sua luta de classes. Sem ce­dên­cias opor­tu­nistas. Não es­que­cendo os crimes nem brin­dando os cul­pados com um perdão de­so­nesto. Mas tra­ba­lhando para traçar os rumos de um fu­turo co­lec­tivo de pro­gresso, li­ber­dade e de igual­dade pe­rante a lei.

Dizia Karl Marx acerca do tra­balho re­vo­lu­ci­o­nário: «Não nos apre­sen­tamos pe­rante o mundo com um novo prin­cípio: eis a nossa ver­dade… ponde-vos de jo­e­lhos ! Mos­tramos-lhe porque é que ele na ver­dade luta e porque a cons­ci­ência é um valor que deve ad­quirir mesmo que a não de­seje».

 

A der­ro­cada do ca­pi­ta­lismo

 

Já che­gavam e so­bravam aos se­nhores da Terra os si­nais de pró­ximo co­lapso dos sis­temas ca­pi­ta­listas que im­põem as leis na Eu­ropa e nas Amé­ricas. Mas como se lhes não bas­tassem os es­cân­dalos e os crimes re­ve­lados dia a dia, mais a crise eco­nó­mica real em que se afundam, vêm agora os povos afri­canos ex­plo­rados er­guer o punho e re­voltar-se. Povos que vivem na mi­séria mas que nadam em «ouro negro». É certo que a Eu­ropa in­dus­tri­a­li­zada possui as má­quinas e as tec­no­lo­gias. Mas tudo de­pende do pe­tróleo afri­cano de «aqui de ao pé da porta». A nova si­tu­ação é de tal ordem grave que se não for re­sol­vida a Eu­ropa ar­risca-se a um recuo his­tó­rico de­sas­troso que a de­vol­verá aos tempos da sua Idade Média. Sem ener­gias, ne­nhuma eco­nomia so­bre­vi­verá.

A par de tudo isto, ve­ri­fica-se um fe­nó­meno cu­rioso.

Pe­rante as vi­o­la­ções bru­tais dos di­reitos hu­manos, todas as re­li­giões his­tó­ricas en­rai­zadas em tão gi­gan­tescas áreas (e não apenas a Igreja ca­tó­lica) calam-se, de­sa­pa­recem da cena ou apenas bal­bu­ciam pro­testos. A tal ponto o es­tado de coisas em­ba­raça as con­fis­sões que ainda se não as­sistiu à in­vo­cação da tra­di­ci­onal «questão re­li­giosa» como ex­pli­cação para as causas das lutas que se de­sen­ca­de­aram. As lutas dos po­bres eu­ro­peus ou afri­canos contra aqueles que os ex­ploram são laicas e re­velam pos­suir uma carga ver­da­dei­ra­mente re­vo­lu­ci­o­nária. São lutas de classes.

Como, no en­tanto, é evi­dente, nada se pode afirmar quanto ao fu­turo pró­ximo. As re­voltas, tal como no-las des­crevem, são es­pon­tâ­neas e ins­tin­tivas. Os ci­da­dãos er­guem-se, lutam e morrem por não po­derem so­frer mais hu­mi­lha­ções. É a tampa que salta sem en­qua­dra­mentos de par­tidos, mo­vi­mentos ou sin­di­catos. São traços de «in­sur­rei­ções» e uma Re­vo­lução não é isso, é rup­tura logo se­guida de pro­posta de or­ga­ni­zação.

Do outro lado da bar­ri­cada, no campo mo­no­po­lista, a «crise» ca­rac­te­riza-se não apenas pela posse de meios, de pro­jectos, de di­nheiro e de for­ma­ções es­pe­ci­a­li­zadas, mas também, ne­ga­ti­va­mente, por um enorme dé­fice de en­rai­za­mento entre as po­pu­la­ções, de li­gação às massas. Se nas suas riquís­simas uni­ver­si­dades, os grandes pa­trões do pe­tróleo e os seus ac­ci­o­nistas re­li­gi­osos apu­raram es­tra­té­gias so­fis­ti­cadas, ca­pazes de com­bater as re­voltas das mul­ti­dões, é cada vez maior o fosso que se­para os ricos dos po­bres. Os mul­ti­mi­li­o­ná­rios, os po­lí­ticos, os bispos e os ban­queiros, sabem como ma­ni­pular as tec­no­lo­gias da co­mu­ni­cação, tecer in­trigas, forjar men­tiras ou in­fil­trar agentes e sa­bo­ta­dores; con­trolam «redes so­ciais», em­presas não lu­cra­tivas, «ins­ti­tui­ções fi­lan­tró­picas», «so­ci­e­dades civis», bancos contra a po­breza ou par­ce­rias com a alta fi­nança sempre dis­posta a pro­meter ao povo «este mundo e o outro». Agora, o seu ob­jec­tivo prin­cipal não é já su­primir as ine­vi­tá­veis mo­vi­men­ta­ções po­pu­lares: é con­quistar-lhes o sen­tido. Mudar-lhes o curso, a di­recção e a gra­má­tica. An­te­cipar-se aos acon­te­ci­mentos, fugir para a frente e «mudar», desde que tudo fique na mesma...

Mas os povos são lú­cidos e aprendem de­pressa. Olhemos com es­pe­rança o que está a acon­tecer!



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