PCP denuncia ataque aos rendimentos dos trabalhadores
Governo
quer piorar as leis laborais
O Governo PS «pretende alterar radicalmente importantes
leis do trabalho e o sistema de Segurança Social», para
«corresponder às imposições da Moeda Única, de uma nova
flexibilização do mercado da força de trabalho» e, em
particular, para «facilitar a contenção ou até redução do
nível salarial dos trabalhadores portugueses» factor que
é identificado (no estudo encomendado pelo Ministério das
Finanças à Universidade Nova sobre os impactos do Euro) como a
principal variável de ajustamento da economia portuguesa no
quadro apertado da União Económica e Monetária.
A acusação foi feita segunda-feira, em conferência de imprensa da Comissão Política do PCP, por Jerónimo de Sousa. Na declaração que leu aos jornalistas, este dirigente comunista acusou ainda o Governo de, com tais alterações, procurar também «dar satisfação às exigências de banqueiros e grandes patrões, reafirmadas em recente convívio, que contou com a presença do primeiro-ministro e metade do elenco do Governo».
Os comunistas
reafirmam «a falsidade de se procurar dar cobertura às
alterações propostas, em nome de uma necessária
"modernização" das relações laborais, que seria
imposta pelo progresso tecnológico e/ou reorganização dos
processos de trabalho», contrapondo que se trata de facto, «no
quadro das opções económicas e políticas de direita do
Governo PS, e em particular a sua opção pelo primeiro pelotão
da Moeda Única, de garantir a rentabilidade financeira e as
margens de lucro».
A Comissão Política alerta particularmente os jovens
trabalhadores, «quantas vezes condicionados pela procura e
manutenção de um emprego, ainda que precário, para que não
aceitem e reajam à concepção deste Governo e destas propostas,
que visam criar condições para a existência de uma nova
geração sem direitos, que passará à geração adulta sujeita
à precarização e à insegurança permanentes».
Lutar e propor
A Comissão
Política do PCP «saúda as fortes movimentações dos
trabalhadores realizadas nas últimas semanas e apela à
continuação da luta para que sejam rejeitadas as graves
alterações da legislação laboral», afirma-se na declaração
de Jerónimo de Sousa.
O PCP declara que «não poupará esforços para alertar e
consciencializar os trabalhadores sobre os objectivos,
calendários e conteúdos desta nova ofensiva desregulamentadora
do direito do trabalho, apelando a que se esclareçam e mobilizem
para impedir que tudo isto passe como "cão por vinha
vindimada", apelando à posição solidária de todas as
forças, homens e mulheres de esquerda, que se identificam com as
grandes causas sociais e considerem como condição da democracia
a existência, o exercício e a cidadania do direito,
consubstanciados no direito ao emprego, à carreira profissional,
aos salários e horários dignificados».
Para responder a estas propostas, o Partido vai brevemente
apresentar na AR um projecto-lei que vise assegurar os direitos
dos trabalhadores em mobilidade (no âmbito das empresas
desmembradas), uma iniciativa legislativa de combate ao trabalho
infantil, a reposição do projecto-lei da idade da reforma da
mulheres aos 62 anos, e a concretização (em discussão e
aprovação na especialidade) dos projectos-lei já aprovados na
generalidade sobre as sanções por violação das leis laborais
e do fim da discriminação dos jovens na atribuição do
salário mínimo nacional.
Jerónimo de Sousa valorizou «o acolhimento que milhares de
trabalhadores, em mais de 380 empresas», deram à presente fase
da Campanha Nacional do PCP, o qual «constitui uma grande
manifestação de confiança sobre a possibilidade e a
necessidade de valorizar o trabalho e os trabalhadores, de
defender e concretizar direitos».
«Como partido de luta e de proposta, o PCP - na AR, na sua
acção política geral, através do empenhamento combativo dos
seus militantes eleitos nas organizações de trabalhadores, não
regateará esforços para suster e corrigir estes objectivos
legislativos do Governo e, simultaneamente, apresentar propostas
justas que correspondam às reivindicações e aspirações dos
trabalhadores», salienta-se na declaração.
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Propostas avançam à sombra da Expo e do referendo
Desestabilizar
pela calada...
O PCP acusa o Governo de - em contradição com os seus apelos
à estabilidade social em nome do êxito e da imagem da
Expo98 - avançar as suas propostas tentando aproveitar a
distracção da opinião pública e dos trabalhadores com aquele
evento e com o referendo sobre a interrupção voluntária da
gravidez.
O executivo PS quer
alterar a legislação por doses, com uma ou outra medida avulsa
de limitado conteúdo positivo; mas, para os comunistas, é
eticamente condenável e socialmente inaceitável que o Governo,
mesmo no plano mediático, tenha posto o acento tónico nessas
medidas avulsas e, conscientemente, tenha sonegado a informação
sobre as peças mais gravosas que já propôs ou já anunciou que
vai propor nos próximos dois meses.
O executivo de António Guterres assume a grave responsabilidade
de querer legitimar, acolhendo em lei, as práticas injustas e
violadoras do direito ao trabalho que proliferam nas empresas e
no sector bancário.
Numa linha de desregulamentação e precarização geral, as
propostas do Governo visam, como alvo principal, os jovens
trabalhadores, procurando impedi-los de usufruir do direito à
segurança no emprego, a horários e salários justos, às
férias, à evolução da carreira profissional e à plenitude do
direito à Segurança Social, direitos que foram conquistados por
outras gerações e estão consagrados na Lei Fundamental.
Sob o chapéu genérico e equívoco da flexibilidade, da
necessidade do aumento da competitividade e até da
solidariedade, propagandeando tal ou tal medida positiva,
procede-se ao silenciamento absoluto sobre peças de grande
calibre e lesivas dos interesses e direitos dos trabalhadores,
alertou Jerónimo de Sousa. A Comissão Política destaca as
alterações pretendidas pelo Governo relativamente a trabalho
a tempo parcial, retribuição, profissões, lay-off,
férias, contratos a prazo e trabalho nocturno.
Perante estas propostas, os trabalhadores vão ter de lutar
para defender, como sucedeu com o horário de trabalho, outros
pilares do Direito do Trabalho expressos em conceitos como emprego,
salário, profissão e férias.
Solidariedade parcial
Com a Proposta de
Lei sobre trabalho a tempo parcial, o Governo não só não
responde à necessária regulamentação e atribuição de
direitos às dezenas de milhar de trabalhadores que laboram nas
grandes superfícies do comércio e na área de serviços - e
que, sob a falsa capa do trabalho a tempo parcial, trabalham
muitas horas, ganham pouco e poucos direitos têm - como procura
colocar a lei em conformidade com as práticas abusivas.
Procura instituir a passagem de trabalhadores efectivos para o
trabalho a tempo parcial.
Hipocritamente, proclama o princípio da solidariedade de
partilha do emprego entre os que o têm e os que estão
desempregados, com a consequente redução dos salários.
A solidariedade não chega à partilha do lucro. Pelo
contrário, não só o lucro fica intocável, como qualquer
entidade patronal que admita trabalhadores a tempo parcial recebe
privilégios fiscais que podem ir até 50% de redução nas
contribuições.
Em causa ficaria o conceito de emprego e o direito à segurança
no emprego, consagrado na Constituição. Empresas haveriam que
levando ao extremo a aplicação da Lei, teriam todos os
trabalhadores a tempo parcial.
Não deixa de ser significativo que a CIP, em sede de
Concertação Social, tenha emitido o parecer mais sumário desde
a sua existência: «a CIP está de acordo com a proposta do
Governo».
Salário condicionado
A par da
descaracterização do conceito do emprego e da sua
substituição por uma coisa denominada empregabilidade,
neste primeiro lote o Governo propõe-se alterar o conceito de
retribuição, para que as componentes variáveis, nomeadamente
os prémios de assiduidade e empenhamento, deixem de ser
consideradas como parte integrante da remuneração do trabalho.
Aumentando a parte variável e pondo em causa o carácter regular
do salário, a proposta visa reduzir os subsídios de férias e
de Natal, o pagamento de feriados, folgas e baixas.
Reduzindo as prestações sociais, reduzir-se-ia a base do
cálculo das pensões de reforma.
Lay-off premiado
Como terceira peça
gravosa, com sentido preciso para ajudar a descapitalizar a
Segurança Social em benefício do patronato, mesmo nas
situações de má gestão, o Governo, em caso de aplicação do lay-off,
quer pôr a Segurança Social a pagar 70 por cento dos salários
e baixar a percentagem a pagar pelas empresas.
Este fio condutor de descapitalização da Segurança Social
está também vertido na proposta do trabalho a tempo parcial e
no novo conceito de retribuição. Só com uma diferença:
os trabalhadores descontariam menos, logo teriam menos direitos;
os patrões também descontariam menos, mas teriam mais
benefícios.
Para diluir a crueza destas propostas, o Governo recorreu, para
além de duas directivas comunitárias, a medidas de acentuação
das sanções e de protecção mínima das grávidas, menores e
deficientes na adaptabilidade do horário de trabalho.
Segunda dose
Jogando e gerindo o
calendário dos grandes eventos e acontecimentos mais imediatos,
seguir-se-ia uma nova dose de alterações alerta a
Comissão Política. Jerónimo de Sousa afirmou que o Governo
incluirá aqui o regime das férias e do trabalho nocturno, o
período de vigência dos contratos a prazo e o reconhecimento
às organizações patronais do direito (que a Constituição só
reconhece às organizações dos trabalhadores) de participação
na elaboração da legislação laboral, a par de medidas que
alterariam o conceito de profissão.
Nesta segunda dose o Governo julgaria de conveniência intercalar
mais uma ou outra medida positiva, que dê carácter difuso às
medidas mais gravosas. Surgiria, assim, a proposta de
regulamentação da eleição de representantes dos trabalhadores
para as Comissões de Higiene e Segurança nos Locais de
Trabalho.
Para os comunistas, são inaceitáveis as razões invocadas
para alterar o direito a férias, submetendo-o direito à
assiduidade e penalizando particularmente os jovens que agora
ingressam no mercado de trabalho e as mulheres trabalhadoras.
Não há justificação nem razões técnicas, jurídicas,
económicas e sociais para propor o alargamento de vigência
dos contratos a prazo de 3 para 4 anos, para trabalhadores
que ocupam, de facto, postos de trabalho efectivos; nem para
prejudicar os trabalhadores em regime de trabalho nocturno.
E não há fundamento nem razão para incorporar em lei o direito
das associações patronais de participação na elaboração da
legislação laboral.
Pedra sem mão
Jerónimo de Sousa
salientou que «o Governo PS não pode atirar a pedra e
esconder a mão!», notando que o executivo de Guterres não
retirou nenhum ensinamento do passado recente, quando um Governo
do PS aprovou a lei dos contratos a prazo, quando os executivos
de Cavaco Silva forçaram a aprovação do pacote laboral
para facilitar os despedimentos e retirar direitos individuais e
colectivos aos trabalhadores.
Da mesma forma, o Governo recusa-se a admitir as razões de fundo
que levam os trabalhadores da Função Pública, os professores,
os trabalhadores da Administração Local, os ferroviários, os
trabalhadores da Hotelaria, da Petrogal e da Dyrup, das empresas
têxteis, a aderir à greve e à luta na defesa de direitos
acusa o PCP.